segunda-feira, 11 de maio de 2015

CONCLUSÃO DAS ETAPAS



O desempenho é tão básico quanto qualquer outra arte. É, talvez, mais criador e útil do que qualquer outro. Envolve-os a todos e mais. Seu apelo é mais direto porque trata dos seres humanos vivos em ação. Porque trata de artifício, material humano em mudança contínua é, talvez, menos controlável do que qualquer outra arte. Pois essa verdadeira razão, se acaso nenhuma outra, exige um estudo longo, árduo, sistemático. Este possui a sua própria técnica definida, variável, mas sem nada definido, não há dúvida, não obstante as opiniões contrárias. Ainda que a habilidade dramática seja fundamentalmente um dom natural, um controle perfeito dos meios de comunicação é necessário para traduzir essa habilidade dramática numa realidade. A arte para ser real deve ser comunicável.

Representar é viver em termos teatrais. Antes de o ator estar preparado para criar um personagem numa peça, ele deve conhecer alguma coisa sobre a matéria que ele utiliza em sua criação, especialmente, para si próprio. Para este objetivo, ele começa uma preparação sistemática, técnica e criadora, da mente, da imaginação, dos sentimentos, do corpo, da voz e da linguagem. Quando tal preparação está bem adiantada, o ator está mais bem preparado para a criação do personagem.

Quais são as etapas necessárias na preparação de um papel? O seu problema é, primeiro, conceber o personagem em sua imaginação, e em seguida comunicar a imagem concebida através de si própria como meio. Como pode ser mais bem levado a efeito isto?

As primeiras duas etapas em sua preparação são destinadas à concepção apenas. Na etapa inicial, o ator lê e relê a peça escrita, e aceita a verdade imaginária de que os personagens são criaturas e os episódios reais. Durante a segunda etapa, ele concebe o “background” do personagem. A fé do ator em si próprio como meio, a sua coragem em provar o mais profundo e a sua humanidade de aproximação (acesso) tudo torna o personagem mais acessível e penetrável.

A terceira, quarta e quinta etapas são destinadas à execução. Durante a terceira etapa, o ator improvisa, proporcionando a si próprio a execução do “background” do personagem, como foi revelado durante a segunda etapa. Esta execução em termos vivos intensifica as imagens do ator e prepara-o melhor para o trabalho na peça, na quarta etapa, quando ele principia o personagem no ensaio. Doravante, durante as etapas quarta e quinta, o único problema do ator é criar o personagem dentro da forma e do modelo da peça.

Durante a quarta ou a etapa do ensaio, ele faz isto, primeiro, provando o mais profundo no “script”: a ideia, o tema e as situações. A seguir, este contato com outros personagens, através de uma aguda sensibilidade, iniciará o “script” em relação à vida. O seu próprio personagem se desenvolverá à proporção que os demais crescem, e as situações elevando-se do conflito do personagem contra o personagem, tirado do enredo. Quando os cinco sentidos do ator estão vivos e o cérebro ativo, o dar e tirar, o tirar e dar, entre os personagens, será transmitido à plateia como uma realidade.

Á medida que os ensaios prosseguem, o ator é cuidadoso não para cair dentro do abismo da antecipação. Ele deve acreditar na ficção, de que o desdobramento da situação está sendo revelado agora pela primeira vez. A concentração sobre o personagem e o fato através dos sentidos assegurarão essa primeira realidade e, finalmente, excluem a intimidade, a antecipação e a memória. À medida que o personagem continua crescendo, a caracterização do ator é ou modificada ou reforçada com cada ensaio seguinte, e ele presta mais atenção aos exteriores do personagem: a constituição, o porte, a aparência e os vestuários. O ator, entretanto, cultiva a atitude de espírito de que o personagem manda e o ator obedece. A obediência a cada personagem, que é consistente com a forma e o modelo da peça, exclui a intrusão subconsciente do “ego” do ator sobre o personagem. Ele segue o pensamento, o tema e o tom do personagem e nunca os quebra, até que alguma coisa ocorra para fazê-lo agir assim.

Com a aproximação da representação ou da quinta etapa, as frases terão sido inteiramente aprendidas e as posições fixadas. Um novo fator – a plateia – passará a julgar a peça e a sua apresentação. O ator deve agora ampliar a sua esfera de concentração até incluir essa testemunha silenciosa através de cujas reações, em cada representação sucessiva, aprenderá cada vez mais sobre o personagem.

A primeira parte traçou a evolução do personagem; a segunda parte destacou a expressão. A expressão no teatro, comparada com a vida, é mais significativa porque a peça é um retalho da vida filtrado através da imaginação do autor. Por isso, o ator deve ser tão significativo em sua expressão quanto o teatrólogo foi na sua. A presença de uma plateia, ademais, faz exigências adicionais sobre a expressão do ator.

Para responder à pergunta “qual a expressão mais irresistivelmente manterá a atenção da plateia?”, nós consideramos o movimento, a voz, a linguagem, o sentimento, a concentração, o relaxamento e a inspiração.

A transmissão visual da peça é expressa no movimento. Portanto, tal movimento é justificado porque exprime a ideia da peça em qualquer momento determinado. O ritmo, a propriedade, a liberdade e a economia caracterizarão todo o movimento. O movimento do ator, no teatro, deve adaptar-se às leis da vida transformadas para ajustar as óticas teatrais. A flexibilidade do corpo é essencial, se acaso o ator está a representar bem as mil e uma cenas exigidas dele no palco. A sua constituição e vestuário revelam a aparência externa do personagem.

Através da voz e da linguagem o ator transmite a peça ao ouvido da plateia. Mediante a ressonância e a articulação, a plateia torna a ouvir claramente e a compreender distintamente. A voz e a linguagem no teatro dependerão do ambiente, associação, educação, preparação do personagem, bem como a plateia. Para ser eficaz, deve ser coloquial. A sensibilidade nascida da concentração no personagem sobre os demais personagens e coisas num ambiente, desestimulará um modelo mecânico de dicção e assegurará simultaneamente uma flexibilidade de harmonia vocal e uma completa compreensão do conteúdo das palavras no momento de sua pronunciação.

O princípio de ajustamento natural do gesto à palavra, da palavra ao gesto é uma verdade contemporânea como o foi quando Shakespeare redigiu o seu conselho aos atores. A pantomima, a gesticulação e o gesto físico são fundamentais, porém a voz e a linguagem particularizam a transmissão e formam uma parte inclusa do comportamento total. Deve existir aquela sincronização de movimento e som, um complementando o outro, de acordo com a sua importância.

A percepção empírica mediante os cinco sentidos e a reação individual para com eles, determinarão a natureza do sentimento. A sensação de sentimento é o resultado do contato individual com um pedaço da vida, quer seja direto, na memória, quer na imaginação. O sentimento artístico chega quando o ator tiver absorvido inteiramente o personagem da peça, através da imaginação, e tiver criado um modelo da peça, mediante o contato com os demais personagens no palco. O sentimento imaginário incita a expressão artística no teatro. A expressão no teatro é a imaginação tornada visível e audível.

A concentração é aquele estado em que a atenção individual está centralizada sobre uma pessoa, objeto, lugar, episódio ou ideia. A concentração é um estado presente. O ato exige, em primeiro lugar, um indivíduo presumivelmente sadio e dotado de instinto e preparação para conceber e projetar um personagem além de si próprio; em segundo lugar, o assunto, que no teatro é uma peça cujos episódios e personagens tenham sido condensados em forma artística; em terceiro lugar, o contato através de uma vivacidade dos sentidos, uma atividade do cérebro e um calor do coração; e em quarto lugar, a ação, o resultado do contato, ou aquele estado de conduta em que o indivíduo reage em relação ao assunto.

O relaxamento é aquele estado vivo em que o externo (o corpo e a voz) obedece aos ditames do interno (a imaginação). O relaxamento chega com a concentração. Uma preparação técnica salutar da mente, da imaginação, do sentimento, do corpo, da voz e da linguagem, e uma concentração não dividida sobre o personagem na situação baseada no estudo da peça do autor, assegurará o relaxamento.

A inspiração é aquele momento em que o instinto dramático afirma-se em si próprio e o ator inconscientemente comporta-se em personagem e no conflito de acordo com a forma e o modelo da peça. Contudo, isto é possível somente quando o ator tiver, através de árduo trabalho, estudo e ensaio, assimilado o personagem e se preparado para receber e bendizer a inspiração, quando e se acaso ela baixar. Durante o momento de inspiração, a plateia não está consciente da forma ou do modelo tal como veio, mas no instante de ser, está em si mesma inspirada para viver imaginariamente a verdadeira vida dos personagens em conflito. É este o milagre do teatro, quando o ator, a cena e a plateia se unem.

Quando o ator capta um sutil momento da vida, tem para esse momento de apanhar um vislumbre de inspiração. Mas deixa-lo para se descuidar em perdê-lo desaparece com o seguinte: pois a perfeição é um ideal.

(IORC)


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