domingo, 30 de dezembro de 2012

NORMAS E CONCEITOS DE TEATRO POPULAR



"Teatro Popular no mundo está dividido em dois lados: o Teatro Popular feito para as massas, teatro aberto a todas as correntes e o político, feito como meio de propagação doutrinária.
Outro aspecto, é que o Teatro Popular, não é um feito que possa valorizar-se exclusivamente do ponto de vista estético. Apesar de que, por um lado, é uma manifestação artística e por outro, é um fenômeno social. A rigor poderia se dizer, que o teatro em si, qualquer que seja sua natureza, se compõe de dois aspectos: o estético e o social. Entretanto, é inegável que a forma bi-frontal, é particularmente importante e essencial no Teatro Popular, pelo menos, no tipo de Teatro Popular que nos interessa. Podemos então, afirmar que essa qualidade é inerente à arte dramática. Por isso, é necessário e fundamental, precisar esses conceitos, para evitar equívocos, colocar-se de acordo sobre o significado da palavra. Quando se diz, “Teatro Popular”, se faz referência a um fenômeno muito determinado que amadureceu na cultura moderna, que pode circunscrever-se historicamente, estruturando uma forma que é peculiar e que de nenhum modo  deve confundir-se  com outras formas de espetáculo disseminadas através dos séculos, algumas vigentes em nossos dias e que se classificam como “populares”. Num sentindo amplo, foram populares: o teatro grego, as representações medievais, a comédia Dell’Arte, antes de ser adotada nas cortes europeias, os saltimbancos, os teatros de feira, o teatro Elisabetano, e nos nossos dias, até pouco tempo a Revista. Esse Teatro Popular, sem dúvida, satisfez as duas faces que abordamos, a estética e a social, próprias do teatro em geral, e do Popular em especial, com uma eficácia espontânea, (especialmente na Grécia, que por legislação, os trabalhadores ganhavam um dia de trabalho, para assistir aos festivais dramáticos) uma exigência natural por parte do povo.
Na sociedade moderna, a partir do século XVII, o teatro passou a ser “funcional”, para uma certa elite, deixando de ser uma manifestação direta da coletividade, isso em virtude de ser realizado em recintos fechados e pouco acessíveis à população. Cada vez mais as estruturas sociais, foram se complicando tornando o problema teatral popular, mais difícil de realizar-se. Pelo menos para aqueles, que buscam seus fins utilitários e de especulação, a tarefa é mais árdua, incerta. O difícil nisso tudo, é interessar o público, e para isso é necessária uma linguagem teatral apta a falar a toda espécie de espectadores: um repertório, que seja imediato e claro, universal, se possível, ou pelo menos aberto. Essa é uma tarefa difícil, numa sociedade como a nossa, onde é raro o interesse e o hábito artístico.
Os problemas que surgem ao se implantar um teatro popular são vários, afora os problemas administrativos e de ordem prática, há, aqueles que se propõe, dar a vida aos teatros populares: deve um teatro popular ser realizado “pelo” ou “para” o povo? Em outras palavras: deve ser um teatro de amadores (como foi o medieval) ou profissional ? (como foi o Elisabetano). Houve durante o século passado, manifestações dos dois tipos, entretanto prevaleceu o profissional, portanto, o teatro “para” o povo.
Outro problema: o repertório. Em que medida condescender com o gosto predominante? Muitos acreditam que para realizar um teatro popular, basta abaixar o preço, outros, que bastaria levar os espetáculos a bairros e interior. Acreditamos que tanto uma política como outra devem ser levadas em conta, apesar de isoladamente, não resolverem o problema.
Um espetáculo tipicamente elitista, de implicações vanguardistas, não se torna popular por se cobrar preços baixos e por ser representado em subúrbios.
Vamos tentar colocar, então, quais as soluções para esse problema:
A massa popular, se vê contrariada ao ter que ir ao teatro que fica distante de sua casa, além de 4 a 10 km. Não sendo o teatro, essencial para o seu lazer, e sim um artigo de luxo, ela não vai ao teatro. Assim, temos que interessá-la, para que esse ato se transforme em necessidade. Temos que despertar seu interesse, fazendo com que possa frequentar o teatro sem ônus, criando assim, o hábito de sair de casa, para assistir teatro. Uma coisa é certa, o povo gosta de teatro, fatores alheios a sua vontade é que impede de frequentá-lo.
Temos certeza, que milhares de espectadores de diferentes camadas têm freqüentado o Teatro Popular do Sesi, o problema a nós imposto, é o de despertar esse gosto latente que existe na alma popular. Algumas questões, podem ser colocadas, como: que as salas de espetáculos, têm de ser de fácil acesso, unindo o público, em lugar de separá-lo; baratear o ingresso, ou torná-lo gratuito se for possível, atingindo a todos, sem distinção; promover os espetáculos, não só com propaganda, mas motivando o trabalhador no seu local de trabalho, com convites, cartazes, etc.; sendo o Teatro Popular um teatro aberto a todos, temos que apresentar obras importantes e de qualidade. O Teatro Popular tem que ter sempre o caráter de uma cerimonia ou de uma festa. Não se pense, que seja apenas uma manifestação festiva, não, terá que ser austera e proveitosa. Austera, porque o Teatro Popular deve encarar os temas fundamentais da vida humana, e proveitosa, porque através do rito teatral, o homem tem possibilidade de encontrar-se mais plenamente e  fortalecer o sentimento de humanidade que o agrega aos demais.
Sabemos que o repertório, é o grande problema enfrentado pelo Teatro Popular, e é fundamental. Ele tem que calar na alma desse público, tem que falar a ele, tem que ser um repertório eclético. As experiências já realizadas e que deram certo, são as do Teatro Elisabetano, Teatro Nacional Popular (TNP), de Jean Villar e o Teatro Popular do Sesi. Peças em sua maioria do passado, não quer dizer que se abandone os problemas do homem de hoje. São clássicos, portanto, falam aos homens de todas as épocas.
Também, não quer dizer, que obras contemporâneas, não se adaptem ao Teatro Popular, apenas, elas são raras ou então, estão por demais longe de uma proposta popular.
Entre as teorias de Teatro Popular, que exige um teatro eminentemente político, apenas didático, e uma experiência que leva milhares de pessoas ao teatro, é claro que ficamos com a segunda.
Está provado, que o teatro dirigido, de pregação doutrinária, não alcança a grande massa. O didático, deve estar mesclado com o prazer, com o divertimento, e aí, poderá interessar. Ao Teatro Popular, não se pode negar as duas experiências. Apesar de algumas críticas, principalmente quanto a palavra “popular”, que parece exclusiva de determinados grupos elitistas, presos a experiências estéticas ou vanguardistas, que nunca atingiram o povo.
Teatro Popular, tem que ser universal, e não exclusivo de uma classe, mas de todas as classes sociais. Ao Teatro Popular, não compete reformar a sociedade, ele quando muito, pode participar desta reforma. A reforma, deve ser feita por políticos, sociólogos, etc. O Teatro Popular, deve aceitar ao público popular, tal qual ele é. E, no público popular há de tudo, até pessoas que não pertencem ao povo. Ao Teatro Popular, não interessa a classe social em números percentuais, o que interessa, é medir o número de pessoas que nunca tinham ido ao teatro anteriormente. Não basta escrever algo destinado ao povo, para interessá-lo. Temos que procurar com dignidade, falar as suas aspirações, seu prazer, enfim a sua vida, só então, chegaremos talvez, a interessá-lo. O público popular é tão expontâneo, que não aceita mistificações. Ele acredita, quando compreende e sente. É puro, mas não ingênuo e acima de tudo, maravilhoso.
Terminando essas conceituações, podemos afirmar que o Teatro Popular, deve educar divertindo, como classificou Brecht.
Vamos concluir, acrescentando um trecho do livro “Le Théatre du Peuple”, de Romain Rolland, escrito em 1903 e que se enquadra perfeitamente, guardadas as proporções de época, ao teatro Popular do Sesi. Teórico, Rolland influenciou Jean Vilar, o criador do T.N.P. na França, que indiretamente chegou até nós.
Vamos as sábias palavras de Rolland: A primeira condição de um teatro popular é a de ser lazer, relaxante. Que por princípio faça bem, e sirva de repouso físico e mental para o trabalhador cansado por sua jornada. Este é um trabalho para os arquitetos do teatro do futuro, os quais deverão cuidar a fim de que os lugares baratos não tenham más acomodações. Também no que toca aos autores,  devem cuidar que suas obras irradiem alegria e não tristeza ou tédio.
O teatro deve ser uma fonte de energia, é a segunda lei. A obrigação de evitar o que esmaga e deprime pode ser negativa; é necessária a contrapartida para restabelecer o equilíbrio sustentar e exaltar a alma. Que o teatro divertindo o povo, o deixe mais apto para exercer suas funções no dia seguinte. Pessoas simples e puras, não terão por outro lado, alegria completa, sem ação. Que o teatro seja um banho de ação. Que o povo encontre no seu autor um bom companheiro de jornada, atento, jovial, se necessário, heróico, que possa apoiar-se em seu braço, e cujo bom humor lhe faça esquecer o peso de sua trajetória.
O teatro deve ser uma luz para a inteligência. Deve contribuir para iluminar a escuridão do cérebro, cheio de dúvidas. A propósito, chamamos a atenção contra a tendência dos artistas em acreditar que todas as suas idéias são boas para o público: não se trata de distanciá-lo para não pensar. O pensamento do trabalhador se acha freqüentemente em repouso, enquanto seu corpo trabalha: é útil que se exercite; e aos poucos que se provoque o desejo e prove dele, o resultado será um prazer, como o é para o homem forte, o exercício que relaxa os seus músculos entorpecidos, por uma prolongada imobilidade. Que se lhe ensine a ver e julgar por si mesmo, as coisas e os homens.
A alegria, a força e a inteligência : eis as três condições capitais para um teatro popular. Quanto as intenções morais que se queira juntar, as lições de bondade, e de solidariedade social, não se preocupem. Só o fato de um teatro permanente, de elevadas emoções comuns e repetidas por um tempo, cria um laço fraternal entre os espectadores...
A grande tarefa reside em fazer entrar mais ar, mais claridade, mais ordem no caos das almas. Já é o bastante colocá-lo em estado de pensar e trabalhar. Não pensemos e nem trabalhemos por eles. O Teatro Popular deve evitar dois excessos opostos que lhe são inerentes: a pedagogia moral, e o diletantismo indiferente que a todo o custo quer impor-se e divertir o povo...
Crie um teatro que transborde alegria e estado de graça. “Alegria, recurso poderoso da natureza eterna: a alegria que move as engrenagens do relógio dos mundos... a alegria que faz girar as esferas nos espaços... a alegria que faz nascer as flores das sementes e os sóis do firmamento”". (ORC)

(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)


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domingo, 2 de dezembro de 2012

Homenagem especial

NIZE SILVA






Um dia como na vida de muitas pessoas afortunadas, surge outra pessoa que o fará mudar de rumo, modificar sua vida para sempre e fazê-lo realmente feliz.
Quando Nize apareceu para fazer o curso, talvez ele não tivesse prestado atenção, fora a beleza, é claro, nem ela muito menos. Estamos falando dos anos 50, época de Elvis, quase Beatles, época de revolução dos costumes. Ele casado com uma filha, ela noiva, mas afinal é apenas um curso de teatro, um curso que mudará totalmente o curso da vida dos dois.
O professor era Osmar, a aluna Nize e a filha eu. Ora, diria meu pai, “não vamos falar de vida particular”. Vamos sim, porque estamos nessa vida para encontrar a pessoa que nos fará MELHOR, nos compreenderá e, assim sendo, será nossa companheira. Estou aqui apenas como testemunha ocular para poder afirmar que meu pai era apaixonado por Nize. Então, Sr. Osmar, com licença, vamos falar de sua musa!
Eles começaram como amigos, afinal os dois eram compromissados. Mas quem resistiria diante das confissões, dos desabafos e de toda cumplicidade que nasceu entre eles? Seria isso história de folhetim? Seria um enredo teatral? Não, foi vida real mesmo. Depois o tempo se encarregou de unir, para sempre, duas pessoas incomparáveis.
O tempo também fez aparecer o enorme talento de Nize como atriz e de Osmar como diretor. Quantas histórias assim existem no mundo artístico? Sabem por quê? Porque isso é maravilhoso!!! O teatro é uma força que nos leva e trás da realidade para a magia, força que nos faz mergulhar em nós mesmos, em observar os outros a nossa volta e de nos apaixonarmos verdadeiramente.
Com tamanha sinceridade nascida da amizade entre eles, logo aconteceu o primeiro beijo... (que eu soube, foi no teatro)
Ninguém mais conseguiu separar esses dois, profissionalmente como pessoalmente. A própria vida havia se encarregado disso.
E eu, finalmente, consegui conhecer a Nize! Esse dia foi inesquecível, não pensei em nada, apenas estava ali, diante da pessoa que meu pai amava. Para mim bastava isso. Mas eu também pude conhecê-la, conviver com ela, aprender.
Tem sido, e será para sempre uma experiência insuperável. Meu pai me deixou de herança muitas coisas, mas a melhor e maior, certamente, é continuar a conviver com a Nize, minha mãe, amiga e confidente.
Por tudo isso, com licença, vamos falar muito da Nize! Ela encantou a plateia do Teatro Popular do Sesi (TPS) desde sua criação. Havia uma sintonia entre ela e o diretor, que colaborava para que o espetáculo resultasse perfeito. Nize fazia a plateia rir ou chorar com ela, ganhando assim o maior prêmio que um ator pode ter, o reconhecimento do imenso público do TPS.






















Depoimento de Nize Silva (Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro, SP, Hucitec, 2001)
Professor Osmar
Osmar, meu professor no “Curso de Atores para o Cinema” do Museu de Arte, convidou-me para fazer teatro no Sesi; ao aceitar o seu convite não poderia supor o quanto minha carreira estaria ligada à trajetória do TPS em todas as suas fases, desde a primeira peça do TES (Teatro Experimental do Sesi), a Torre em Concurso de J. M. Macedo até Confusão na Cidade de Goldoni, trinta anos depois. Sinto-me recompensada por ter participado da única companhia brasileira, cujo projeto de popularização do teatro logrou êxito.
Lembro-me de como foi emocionante ver uma enorme massa popular se comprimindo junto às portas do Teatro Municipal, quando da apresentação de O Fazedor de Chuva do Richard Nash. Os funcionários do teatro temerosos recomendavam que as portas do teatro fossem abertas mais cedo, temendo pelo pior. Do camarim onde estávamos ouvíamos a correria em busca dos melhores lugares. Quando a cortina abriu a casa estava lotada, lotada de gente que vinha pela primeira vez assistir a uma peça teatral e que pela primeira vez entrou num teatro até então frequentado pela elite paulistana. Nessa noite percebi que se o Osmar conseguisse levar adiante o seu projeto, teria sucesso.
Não foi sem luta, força de vontade, entrega, que o TPS obteve o reconhecimento, da própria entidade e da crítica. (...)
Impossível por isso dissociar o TPS do homem. (...)
Prazer era o que ele sentia ao dirigir uma nova peça. Quando esta entrava em cartaz, assistia a alguns espetáculos até apurá-los. Depois durante toda a temporada em que as peças permaneciam em cartaz, não assistia mais, mas ouvia!... de sua sala, onde mandou que instalassem uma caixa de som. Era assim que controlava os atores.
Até hoje me pergunto como conseguia administrar todas as funções que exercia, sim, porque além de Diretor Artístico, administrava o Teatro e ainda dirigia uma Divisão de Divulgação. Não é à toa que morava praticamente no teatro, de segunda a segunda a qualquer hora do dia ou da noite era encontrado nas dependências do teatro. Acumulou um colosso de férias.
Esse entusiasmo foi me envolvendo de tal forma, que mesmo quando não estava na peça em cartaz, ia quase toda noite ao teatro. Desse convívio, meu professor, meu diretor, tornou-se em 1974, meu marido. Continuei minha carreira no Sesi, das vinte e cinco peças do seu repertório, devo ter participado de umas vinte. Para aqueles que sempre acharam que como esposa do diretor eu tinha privilégios, enganaram-se, nunca fui tão cobrada, nunca tanto foi exigido de mim depois de casados.
(...)






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sexta-feira, 23 de novembro de 2012

GRUPOS DRAMÁTICOS






"O teatro popular não é um movimento estético é um movimento social"

"Nessa época eu tinha deixado de fazer TV e como no Sesi ia haver um concurso para trabalhar como ensaiador de peças, na época chamava-se assim, prestei esse concurso e passei em primeiro lugar. O Nicanor Miranda que fazia parte da banca, era o chefe do Serviço de Teatro do Sesi.
(...) 
Optei por aceitar a função de ensaiador, porque estaria lidando com teatro que era minha meta, fui para Santo André ensaiar um grupo do “clube” da Fábrica Rhodia. O mais  interessante é que encontrei nesse grupo um pessoal esforçadíssimo. O Chiarelli que era chefe da “troupe” era muito dedicado e um bom cômico. Ensaiei com eles o Maluco n.º 4 de Armando Gonzaga que foi um sucesso estrondoso. O Armando Gonzaga é um autor que faz sucesso, claro que não para a elite intelectual. As peças dele funcionam para o grande público popular. Os cenários eram alugados na Casa Teatral, quase tudo que usávamos era alugado. Eu morava no Cambuci e pegava um ônibus que passava na Av. Independência, era uma viagem longa até chegar em Santo André. O ensaio era às 20 horas e eu tinha de tomar o ônibus às 18 e 30 horas, durante o percurso aproveitava para ler.
(...)
Fazer um teatro popular voltado para a grande massa era uma velha ideia que começou a se solidificar na Rhodia. A cada nova peça a casa enchia que era uma loucura! O público se divertia tanto que queria ver de novo a peça e vinham várias vezes.
Comecei a perceber que peça brasileira faz grande sucesso, sucesso que se repetiu mais tarde no Teatro Popular do Sesi, quando montei, “Manhãs de Sol” de Oduvaldo Viana. Havia assistido essa peça, ainda rapazinho, em Campinas com a Cia. de Emílio Russo e Norma de Andrade, o espetáculo fascinou-me ficando na minha lembrança. E o Paulo Mendonça, que assistiu a minha montagem no TPS, em sua crítica chegou a comentar que essa escolha  devia ter sido motivada por alguma fixação de infância. Algum tempo depois tive a oportunidade de lhe dizer que tinha acertado em cheio, isso foi quando estivemos juntos na diretoria da APCT, que depois virou APCA, ele como presidente e eu como secretário. O Paulo Mendonça foi um crítico que amava o teatro acima de tudo, suas críticas eram muito bem feitas, foi um crítico muito importante.
(...)
GRUPOS DRAMÁTICOS 
Entrei no Sesi em 1951, para ensaiar grupos dramáticos, o Sesi tinha uma estrutura de teatro completamente arcaica. Havia um grupo dramático na rua Visconde de Parnaíba, que era o Clube do Trabalhador, lá o Nicanor Miranda ensaiava os grupos dramáticos e o Sesi resolveu contratar mais ensaiadores para desenvolver o teatro nas indústrias. Foi por isso que eu fui para a Rhodia, mas, com o decorrer do tempo, esses grupos dramáticos não eram nem de operários, nem de estudantes, era de gente que queria fazer teatro. Acho até que era interessante, mas quem assistia aos espetáculos eram amigos, família, pessoal do clube que patrocinava o teatro. Tinham trinta e tantos grupos dramáticos, era uma coisa de louco!, cada ensaiador tinha dois, três grupos e cada ensaiador... um era pior que o outro! Aquilo me deixava meio confuso, meio atrapalhado, porque eu achava que o Sesi tinha obrigação de fazer um teatro melhor, porque os grupos eram de atores fracos, que não tinham condições de fazer teatro, então os espetáculos eram falhos, os cenários eram alugados na Casa Teatral, os móveis, tudo... foi como eu fiz na Rhodia!" (ORC) 

(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)

SESI - Serviço Social da Indústria
APCT - Associação Paulista de Críticos Teatrais
APCA - Associação Paulista dos Críticos de Artes


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domingo, 18 de novembro de 2012




COLUNA DE TEATRO - O GLOBO - POR ZORA SELJAN – 17/06/1960
“O Teatro e sua Técnica”
Acaba Osmar Rodrigues Cruz de publicar pela Livraria Teixeira, de São Paulo, um bom trabalho intitulado “O Teatro e sua Técnica”. Este livro como diz o autor, não tem a pretensão de doutrinar, nem apresentar algo novo. Dirige-se aos amadores, àqueles que se iniciam na arte dramática.
Aconselhamos este livro por ter-nos parecido honesto e feito por que revela grande experiência de professor. Achamos que livros assim podem impulsionar o movimento teatral amador e mesmo criar teatro em lugares que não existem cursos de arte dramática. Para que se tenha ideia de sua validade, basta uma vista de olhos no prefácio e na seleção de matérias: ARTE DE DIZER: respiração - mecanismo de voz – pronúncia – declamação – dicção – análise do texto – inflexão – palavras de valor – ritmo; ARTE DE REPRESENTAR: introdução – conhecimentos gerais – o ator e o comediante – vocação e inteligência – a estrutura do palco – interpretação interior, estudos preliminares – o caráter, as emoções - observação e estudo do papel – a verdade – memória e emoção – imaginação – concentração, ação interpretativa – identificação – ritmo – interpretação exterior. Expressão corporal das emoções – relaxamento dos músculos, ginástica rítmica – gestos – fisionomia – mímica – pantomima – improvisação – representação; A ENCENAÇÃO: direção – representação dos atores, cenário – indumentária – iluminação – adereços – pessoal técnico – texto – vocabulário; ILUMINAÇÃO CÊNICA: a evolução – análise prática – notas técnicas.
Transcrevemos ao acaso um dos temas abordados, o de “Ator e o Comediante”, Louis Jouvet distingue na arte de representar duas classes de intérpretes: o ator e o comediante. “O ator é aquele que interpreta um só gênero dramático, isto é, comédia ou drama. Mesmo que tenha uma bagagem técnica e cultural muito grande, ao tentar outro gênero, não consegue uma interpretação verdadeira. Cita Sarah Bernardt o caso de Cocquelin, que tinha como maior desejo interpretar uma tragédia, todavia seu físico e sua fisionomia não o permitiam. Já o comediante, pelos dotes físicos ou naturais, é aquele que pode com igual perícia dar a ambos os gêneros interpretação de valor”.

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quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Revista de Estudos Teatrais


















DIÁRIO DE SÃO PAULO – POR OSCAR NIMITZ - 22/01/1958
Osmar Rodrigues Cruz eleito presidente da FPAT
Osmar Rodrigues Cruz é o novo Presidente da Federação Paulista de Amadores Teatrais. Até o fim de 1958, ficará sob a sua responsabilidade os destinos da entidade magna dos amadores do Estado.
Além de Osmar, foram eleitos Moisés Leiner, Francisco Giaccheri, Martin Solé, Oswaldo Pisani e muitos outros, que colaborarão para que as atividades teatrais se movimentem com mais intensidade.
A posse da nova diretoria será ainda este mês, conforme nos declara Nicolau Cinelli, ex- presidente da FPAT.
Podemos informar que uma das primeiras iniciativas da nova direção, será o lançamento, novamente, da Revista do Teatro Amador, uma vez que já conta com uma verba anual de Cr$ 100.000,00, fornecida pelo governo do Estado, anualmente, para sua impressão.
“Ronda” prognostica grandes atividades da FPAT neste ano.
COLUNA SESSÃO FOLHA DE TEATRO - FOLHA DA MANHÃ - POR DELMIRO GONÇALVES - 25/04/1958
“Revista de Estudos Teatrais”
“A Federação Paulista de Amadores Teatrais lançou a sua primeira publicação, graças à verba concedida pelo governo estadual, através de sua Comissão de Teatro”. Assim inicia a direção daquele órgão a apresentação de sua nova publicação. Como se vê, o Plano Estímulo ao Teatro começa a funcionar bem, e dentro da linha a que seus relatores se propuseram, isto é, incentivar principalmente o lado cultural, procurando por todos os meios a seu alcance, criar uma consistência e um interesse maior da população pela arte cênica.
A revista da Federação termina a abertura da apresentação com as seguintes palavras: “Esta será a nossa revista. Simples, pequena, humilde e com uma única finalidade: dar um pouco a todos aqueles que desejarem recebê-la tal qual ela é. Longe de nós qualquer pretensão de doutrinar e orientar”.
Assim ficam já delineados e delimitados, desde o primeiro número, as intenções e os objetivos da nossa publicação. Sem alardes, sem grandes pretensões, apresenta-se a revista em cuidadosa feitura gráfica, discreta e de bom gosto.
O primeiro artigo é assinado por Ruggero Jacobbi, denominando-se “A direção: texto e espetáculo”. Trata-se de um longo e interessante trabalho que ocupa mais ou menos 13 páginas da publicação, no qual o autor examina com cuidado os diversos encenadores mundialmente famosos. Trata-se de um artigo de grande interesse e que situa a revista num plano bem mais elevado do que os seus diretores modestamente pretendem. Tanto melhor assim. A pretensão tem sido uma das causas que fizeram malograr muitas das nossas atividades artísticas. Se a direção da revista puder sempre apresentar artigos do nível daquele que inicia este seu primeiro número, ganharão todos e o órgão da Federação se colocará entre as melhores publicações do gênero existentes no Brasil. Segue-se “Uma aula de Stanislawski”, texto traduzido por Abílio Cordeiro. Osmar Rodrigues Cruz assina trabalho sobre a “Origem da renovação no teatro brasileiro”. Termina a parte referente às colaborações sobre teatro uma de W. Lourenção, intitulada: “O teatro antigo na Índia”. Finalizando o primeiro número, acha-se publicada na íntegra a farsa de Gil Vicente “Quem tem farelos”. Assim a Revista de Estudos Teatrais apresenta-se num nível bem alto, pequena mas com artigos de bastante interesse, que poderão servir de maneira producente a todos os que se interessam pela arte cênica.
A direção composta por Osmar Rodrigues Cruz, Gilberto Rendelucci e Kaumer D. Rodrigues merece ser aplaudida pelo cuidado com que este número foi confeccionado e pela seriedade dos trabalhos ali contidos. Esperamos, pois, que prossiga a Federação a apresentar a revista no nível atingido em seu primeiro número.
Relação das Revistas publicadas e dos artigos em cada exemplar:
Nº 1 – Abril de 1958
A direção – texto e espetáculo por Ruggero Jacobbi, Uma aula de Stanislawsky traduzido por Abílio Cordeiro, Origem da renovação no teatro brasileiro por Osmar Rodrigues Cruz, O teatro antigo na Índia por W. Lourenção, “Quem tem farelos?” de Gil Vicente.
Nº 2 – Junho de 1958
Nota sobre a profissão do ator por Maria Tereza Vargas, A profissão do ator por Lucien Nat, A responsabilidade do ator de Stanislawky, O ator – dilentantismo e assenhoreamento da arte de Alexis Tairov, O ator e o teatro na vida contemporânea de Max Reinhardt, Preparando a personagem de E. Vaghtangov, “Bilbao, via Copacabana” de Oduvaldo Vianna Filho.
Nº 3 – Setembro de 1958
Teoria Geral do Teatro por Roggero Jacobbi, O diretor no teatro de hoje por Emílo Fontana, Meu método de direção teatral de G. B. Shaw, O encenador de Gastão Baty, “Martim Pescador” de Augusto Boal.
Nº 4 e 5 – Dezembro de 1958
Teoria Geral do Teatro (continuação) por Roggero Jaccobi, A luta por uma dramaturgia por Osmar Rodrigues Cruz, Valorização de O’Neill por Paulo Hecker Filho, Prefácio de “Cromwell” de Victor Hugo, A arte do drama de Ronald Peacock, “História em quadrinhos com final feliz” de A. C. Carvalho.

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sábado, 27 de outubro de 2012

Osmar Cruz e seu Teatro de Arte

Como a narrativa de Osmar em seu livro é muito saborosa, escolhemos como ilustração de hoje o trecho a seguir:

(...) Foi o Carlo Giaccheri quem me convidou para fazer teatro na televisão, não havia teatro ainda, porque a televisão estava começando, eles fizeram uma transmissão externa de “Ralé” do Gorki, mas não faziam teatro na Tupy. Então ele me convidou para fazer teatro ao vivo, o Giaccheri me perguntou quem mais poderia ir e eu indiquei o Antunes, ele fazia numa semana e eu na outra. Eu queria que o teatro se chamasse “Pequeno Teatro de Arte”, mas o Costa Lima que era o diretor geral achou que a palavra “pequeno” era muito ruim, então ele pôs Osmar Cruz e seu teatro de arte. Foi uma experiência muito boa, estávamos começando a fazer teatro, éramos amadores, foi o primeiro dinheiro que eu ganhei com o teatro. O dinheiro é importante, porque nos estimula a profissionalizar. Havia muitas peças a serem escolhidas, mas tinha que se pagar direto autoral e a televisão não ia pagar para ir ao ar apenas por um dia.  Escolhi peças que já tinham sido feitas, entre elas O Imbecil de Pirandello, porque alguém já tinha feito e pago os direitos. Nós ensaiávamos no Centro Acadêmico, estavam o Ítalo Cincini, Nelson Coelho, Aycilma Caldas, outros atores que eu não lembro agora e também o Fábio Sabag, hoje produtor de televisão. Antes de serem levadas ao ar as peças escolhidas, era lido um comentário que constava de uma pequena biografia do autor e uma rápida visão do significado da peça.  Foi um sucesso enorme. A transmissão nesse tempo era feita ao vivo, não havia vídeo tape estávamos em 1951 e não havia televisão em todos os lugares, então a fim de promover os transmissores, a indústria de televisores cedia aos bares um aparelho onde as pessoas se concentravam para assistir. Fiz um repertório e um orçamento de quatro peças, eram dois meses, mas quando a transmissão acabou ficou todo mundo parado, porque a peça “O imbecil” é realmente uma peça empolgante. O tema é simplérrimo mas o Pirandello é genial. É a história de um editor de jornal, que manda chamar uma pessoa que ele conhecia e que estava doente para morrer; então ele chega para ela e diz: - “você vai morrer mesmo, eu te dou um dinheiro e você mata fulano”, que era um inimigo político dele. A peça gira em torno do diálogo dos dois, é muito interessante, eu contando não é, mas a peça é muito interessante. Eu tive o prazer de trabalhar com o Cassiano Gabus Mendes, Heitor de Andrade, Luiz Galon, Renato Galon, foi o primeiro teatro feito ao vivo na TV. Foi um sucesso.

CRÍTICA - DIÁRIO DE SÃO PAULO – 07/11/1951

Tele-Teatro das Segundas-feiras

A PRF3-TV, estação de TV das rádios Tupi – Difusora, inaugurou, Segunda-feira última, com êxito absoluto o seu “Tele-Teatro das Segundas-feiras” apresentando a peça “O imbecil” de Pirandello, na interpretação de “Osmar Cruz e seu teatro de arte”. Caprichosamente dirigida e apresentando valores artísticos de relevo, “O imbecil” conseguiu pleno êxito, agradando a um número bastante grande de tele-assistentes que aguardavam a iniciativa da televisão “associada”. Para a próxima Segunda-feira está programada a peça o “Urso” de Anton Tchecov, na interpretação do Centro de Estudos Cinematográficos sob a direção de José Alves Antunes Filho, cenografia de Carlos Giaccheri e produção de TV de Cassiano Mendes e Heitor de Andrade.

- Eu precisava de uma outra peça que fosse de domínio público, então escolhi uma que eu acho muito bonita, o autor é muito bom, é Uma Tragédia Florentina do Oscar Wilde. Fizemos a peça com trajes e adereços da Casa Teatral, a peça é de época, passa-se no Renascimento. Foi muito interessante, não era “O imbecil”, lógico, mas a nossa sorte foi estrear com “O imbecil”, porque  ficou marcada como uma coisa boa ou seja, “Osmar Cruz e seu teatro de arte só faz coisa boa”. Só que a “Tragédia Florentina” não foi tão boa assim, mas deu “para quebrar o galho”. Eu fiz do Alfred Musset, Uma porta deve estar aberta ou fechada, é um diálogo entre dois personagens que se separam. Como os atores vinham do amadorismo ensaiavam pelo telefone, eles ”batiam” texto para decorar por telefone, eu fiz dois ensaios,  marquei num sábado e domingo, e foi ao ar na segunda-feira. Tínhamos 15 dias para preparar a peça, enquanto o Antunes preparava a dele eu preparava a minha. O Antunes estreou com “O urso” de Tchecov, com o Manoel Carlos no papel do urso, hoje ele escreve novela. Mas, “Uma  porta deve estar aberta ou fechada”, quando eu vi no “swit” realmente achei muito chata embora os cortes tivessem sido feitos pelo Cassiano Gabus Mendes. Depois montei o Traído Imaginário que é o “Sganarello” do Molière, essa fez sucesso. Eu fiz também um Gil Vicente, Quem tem farelos. Fazer televisão nessa época era uma tourada, porque era ao vivo. Eu só fui gravar na Excelsior, quando o Armando Bogus arranjou um “tape”. Mas, “Quem tem farelos” era uma peça muito interessante que é o embrião da “Farsa de Inês Pereira”, é muito engraçada, muito boa. Nós não tivemos tempo suficiente para adaptar a peça, ela foi feita numa linguagem mais ou menos arcaica. Já o “Traído Imaginário” não, por isso funcionou. O ator que fazia o “Sganarello”, trabalhava no Maria Della Costa, ele tinha ganho um concurso – Um galã para Maria Della Costa - era o Alberto Maduar. Ele custava um pouco para decorar e na peça tinha um monólogo que fala da suspeita que a mulher o engana. A peça tem esse bonito monólogo, muito bem, o Alberto Maduar entra em cena para dizer o monólogo e... pára, fica olhando, o Cassiano fala para mim: - “ xiii... acho que esse não vai” e fala para o câmera, “passa a câmera pelo cenário”, nisso o Maduar saiu de cena e deram a fala para ele. Ele voltou, foi falar... esqueceu de novo. E fez isso duas vezes! Aí eu falei, "tamo roubado...”. Mas eu acho que o público nem percebeu, porque a câmera ficou em detalhes no cenário, que era do Carlo Giaccheri e era muito bonito. Com o “Sganarello” eu encerrei minha carreira na Tupy, porque esse teatro que a gente fazia começou a dar “cosquinhas” no pessoal da televisão, eles já estavam se preparando para fazer o “Hamlet” com o Lima Duarte e não houve interesse de nos manter lá. Eu só fui fazer televisão mais tarde, quase dez anos depois na TV Excelsior. O Antunes Filho era assistente de produção da Bibi Ferreira que era a produtora do Teatro Brastemp e quem dirigia era o próprio Antunes, mas como ele não dava conta da programação, pois toda a semana era apresentada uma peça diferente, ele me convidou para dirigir, fiz com a Irina Greco e o Armando Bogus “O menino de Ouro” de Clifford Odets, que foi um sucesso! Foi muito bonito, foi muito bom.

CRÍTICA - ÚLTIMA HORA - COLUNA SHOW BUSINESS POR MORACI DO VAL - 19/12/1962
Fuga à rotina
“O Campeão” de Clifford Odets, apresentado pelo teatro do 9 na noite de sábado, desculpa a emissora das inúmeras vacuidades que vem apresentando em seus últimos teleteatros. Foi uma fuga da rotina, num espetáculo muito bem cuidado. Otimamente interpretado e com um dos melhores textos do teatro norte-americano na fase dos trinta: “Golden Boy”. Nele temos o Odets dos bons tempos, quando ainda não tinha naufragado no “american way of life” não pensava em escrever roteiros para Elvis Presley e fazia uma severa crítica  à  “teoria do sucesso” e à “vida impressa em dólares”. “Golden Boy” ou “O Campeão”, como se chamou na tradução de Elizabeth Kander, é a peça em que critica com maior felicidade o “american way of life”, como processo arrasador das possibilidades autênticas do homem. Bonaparte, “O Campeão”, é levada por essa obrigatória luta pelo sucesso, a trocar sua verdadeira aspiração, a música, o violino, pelo boxe. Com a fúria proveniente dessa frustração, atinge o auge no pugilismo, carreira que detesta e se vê obrigado a seguir. No momento em que alcança o título, matando no ringue seu adversário, adquire a consciência e quer voltar para música. Impossível: a terrível luta pelo sucesso aniquilara suas possibilidades para a música. Já não tem mãos para o violino. Fábula terrível. O espetáculo do 9, sob direção de Osmar Cruz, esteve à altura do texto, lamentando-se apenas o corte da cena final. Mutilação condenável e que quase põe a perder o espetáculo. Culpa da emissora que, em lugar de reduzir os comerciais, preferiu cortar a peça. No elenco, um excelente trabalho, Armando Bogus vivendo o “Golden Boy”, seguido de perto por Irina Greco, em “Lorna”, Edney Giovenazzi, em “Fuzelli” e Jairo Arco e Flexa, no papel de “Moody”.

- Só teve um problema, o Bogus arrumou na Tupy, um pedaço de vídeo tape para gravar a peça, nessa época já tinha vídeo tape e nós estávamos gravando, quando chegou no último quadro da peça acabou o vídeo tape. Não pudemos gravar o final original, fizemos um final em que os dois morrem num desastre de automóvel. Depois do Menino de ouro, fiz A pequena da província que ficou bonito, essa foi direitinho, com o Bogus, a Irina, Felipe Carone, Jairo Arco e Flexa, Ednei Giovenazzi, agradou muito, é uma história de amor e eu gostei muito de fazer. Mais tarde recebi um convite de Tatiana Belink e do Júlio Gouveia diretores do TESP (Teatro Escola de São Paulo) para dirigir uma novela na Excelsior, graças ao dois teleteatros que eu tinha feito. A novela chamava-se Sozinho no mundo, no recém-lançado “Telespetáculos Elgin” com atores do TESP e atores convidados como o protagonista Jairo Arco e Flexa e Nize Silva. Era uma novela que já era gravada. Era sobre o nazismo. A ação se dá no apartamento de um casal cujo marido é um brasileiro, adido cultural em Paris e ela parisiense, eles têm um filhinho. A casa deles é invadida pelos soldados nazistas e o filhinho é separado dos pais, que vão procurá-lo depois da guerra. Quando chegou no 15o capítulo mudou a direção da TV Excelsior, entraram o José Bonifácio Sobrinho e o Edson Leite, como eles iam reformar tudo a novela teve de acabar, a Tatiana escreveu um final, quebraram o contrato com o patrocinador, foi um negócio de louco! Eu fui encontrar isso tudo, depois no Sesi, essa prepotência, esse autoritarismo. Por aí parou a minha aventura na televisão, depois disso eu não fiz mais nada. Mas não deixou de ser uma experiência interessante, porque eu fui o primeiro a fazer teatro em televisão. Quem sabia disso era o Dionísio Azevedo que no seu depoimento por ocasião da comemoração dos 30 anos do TPS, fala isso: - “Osmar Cruz gosta tanto de teatro, que foi o primeiro a fazer teatro em televisão”. O Galon também. (ORC)

(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)

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sábado, 20 de outubro de 2012

Revista do Teatro Amador

 
COLUNA TEATRO - DIÁRIO DE SÃO PAULO - POR NICANOR MIRANDA - 03/09/1955
“Revista do Teatro Amador”
Elevado é o número de amadores em nosso Estado. Raro é o município que não conta com um grupo de pessoas que gostam de teatro e que realizam, pelo menos de longe em longe, um espetáculo. As dificuldades que a maioria dos amadores encontram para satisfazer a sua inclinação e vocação dramática não são pequenas e nem poucas. As mais efetivas, talvez consistam em dois fatos notórios; não conhecerem peças que se prestem aos seus espetáculos e não terem meios de encontrar ou adquirir as que servem. A bibliografia nacional, segundo Lopes Gonçalves que está procedendo um levantamento de tudo que existe, anda pela casa das dez mil peças. Evidentemente nessa dezena de milhares existe muito bagaço e pouco suco. Mas o que sobra muitas vezes não é fácil de encontrar no mercado livreiro. Quanto às estrangeiras, os amadores são geralmente criaturas atemorizadas com o bicho papão da SBAT, que não tem a mínima condescendência para com os amadores e nem procura ajudá-los desta ou daquela maneira. Faltam-lhes ainda encenadores, faltam-lhes cenógrafos... para auxiliá-los com eficiência nas realizações de seus espetáculos. A bem dizer, falta-lhes quase tudo, exceto boa vontade e paixão pelo teatro.
Diante de tais obstáculos, nada melhor poderiam eles ter feito do que se congregarem, reunirem-se em uma associação que cuide de seus interesses. Tal medida já foi posta em prática com a fundação da Federação Paulista de Amadores Teatrais, sob os auspícios da Associação Brasileira de Críticos Teatrais de São Paulo. Os resultados não demoraram a aparecer. Graças a Federação, os amadores já realizaram um festival e um congresso. No momento preparam outros dois para o mês vindouro. Além disso, instituíram um interessante concurso de crítica anual, do qual não podem participar, é óbvio, os profissionais militantes na imprensa paulistana.
Mais uma bela iniciativa acabam de tomar, recentemente, editando a “Revista do Teatro Amador”, cujo primeiro número foi publicado no mês de agosto findo. A revista é modesta e despretensiosa, mas o seu objetivo capital é inteligente e merece ser elogiado: “O teatro amador em nossa terra e particularmente em São Paulo, embora a sua evolução marcante, não possui um núcleo que irradie a arte de representar, propagando-se e realçando-a. Assim sendo, as sociedades, pelos seus grupos teatrais, encontram-se individualizadas e seus trabalhos não têm a repercussão requerida, por não serem divulgados. Portanto, fazia-se mister que um porta-voz unisse os elos que encerram as coisas teatrais, formando assim a cadeia sólida e coesa para demonstrar e evidenciar o valor da arte cênica”.
A missão dos amadores não é somente difundir o gosto pela arte dramática nas camadas populares. É também uma missão educativa, de mérito indiscutível, tão explícita que dispensa esclarecimentos. Que não arrefeçam em seu entusiasmo, que não desistam de lutar contra todo e qualquer empecilho que lhes surja no meio da jornada. Assim agindo, não tardará o tempo em que os amadores paulistas serão, além de rico celeiro do teatro profissional, idealistas dignos de admiração e respeitáveis cultores de uma arte milenária que apaixona cada vez mais os homens dos cinco continentes.

(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)

domingo, 14 de outubro de 2012

Volta à cronologia.


Prêmio Arlequim Melhor Diretor
CRÍTICA -  JORNAL O TEMPO - COLUNA PALCO - POR ATHOS ABRAMO - 09/12/1954

Festival de Teatro Amador III

A representação de “As guerras do Alecrim e da Manjerona”, pelo Grêmio da Caixa Econômica Federal, constitui uma das mais importantes manifestações do Festival, não somente pelo que significa, no plano cultural, a exumação dessa peça do nosso teatro clássico, como ainda pela inteligência com que foi encenada e pelo êxito positivo alcançado pelo espetáculo. Embora dentro da modéstia que o amadorismo comporta, o tratamento dado pelo diretor, Osmar Rodrigues Cruz, foi dos mais eficazes e válidos teatralmente falando, e poderá servir como ponto de referência  para futuras edições.  Sabe-se quais dificuldades Antônio José da Silva acarreta para uma representação integral, no texto e na cenografia. Essas dificuldades foram resolvidas com brilho, ao adotar-se um esquema cenográfico de interiores muitos simples e sóbrios, e de exteriores supridos por cortinas pintadas, ou melhor, desenhadas. O efeitos de tais cortinas, de autoria de Francisco Giaccheri, foi dos mais genuinamente teatrais e sua aplicação, assim como certos expedientes de mudança direta de cenários, executados pelos próprios atores em cena, juntamente à viva mobilidade da recitação, revelaram o bom e adequado aproveitamento da recente lição proporcionada  pelo “Picollo Teatro” de Milão em “Arlequim servo de dois amos” e em “Júlio César”. A direção de Osmar Rodrigues Cruz foi uma das mais seguras acontecidas no Festival, e caracterizou-se pela atenção dada ao aspecto filológico da peça, enfrentando não somente sem escamoteações, mas mesmo com apaixonada competência. O espetáculo foi dirigido no sentido de atingir-se a maior leveza e rapidez de recitação possível em elementos não afeitos às representações diárias como são os amadores, e isso foi conseguido, apesar de algumas falhas do elenco. Deste temos a assinalar primeiramente, a ótima dicção de Carlos Henrique Silva, no papel de Semicúpio. Dotado das necessárias agilidade e mobilidade físicas, agindo numa marcação sempre segura e viva, esse amador foi uma revelação. Prejudica-o muito um leve defeito de dicção, defeito que impede infelizmente seja ele considerado como um dos melhores atores da comédia do Festival. Mesmo assim, tenho uma grande fé no futuro desse rapaz, cuja mocidade, resistência e energia recitativas a justificam plenamente. Tudo dependerá, no entanto, da eliminação de seu defeito de pronúncia. Cora Gurjão Cotrim, no papel de Sevadilha, foi por sua vez digna “partner” de tal Semicúpio. Muito jovem, dotada de um físico adequado e de uma voz da mais cristalina musicalidade, e senhora de uma dicção perfeita, também essa moça poderá representar uma esperança, no caso em que puder estudar  e corrigir-se de certa instabilidade e precipitação no jogo cênico. Joaquim Mário Sonetti, no papel de Lancelote; Maria Quadros Malta, no papel de Dona Cloris; Moisés Leiner no de Tibúrcio, foram os outros elementos que tiveram atuação correta e realmente muito eficaz nas cenas cômicas. Ao grupo todo do Grêmio da Caixa Econômica Federal vai um caloroso aplauso pela coragem demonstrada em levar para a cena a trabalhosa e talvez envelhecida, mas genial peça do Judeu. E uma exortação a continuar nesse caminho: o da exumação de nosso pequeno mas tão significativo repertório clássico.
(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)       

domingo, 24 de junho de 2012

Nelson Rodrigues em São Paulo




Mais uma vez interrompemos nossa cronologia de postagens para abordar um assunto de extrema relevância.


Foto Silvestre Silva

Nelson e todo elenco da peça


Já não nos causa estranheza o fato da memória de nosso país ser totalmente ignorada. Ignorantes que somos como resultado, também, do esquecimento, do sepultamento, até da incineração de fatos e seus documentos.
Papéis velhos, amarelados, registros em computador que devem ser deletados, enfim nossa memória e aqueles que pertenceram à ela, não estando na mídia estão condenados ao banimento de nossa realidade.
Por tais motivos, não estamos surpresos com o que vem acontecendo esse mês no Sesi São Paulo, mas sim indignados com o descaso. 
Foi iniciada uma homenagem aos Cem anos de Nelson Rodrigues e simplesmente não consideraram que:
1.      Em 1979 o Teatro Popular do SESI (na mesma sala de hoje) sob a direção de Osmar Rodrigues Cruz encenou a peça teatral A Falecida de Nelson Rodrigues com cenário de Flávio Império registrados nos livros:  de Renina Katz e Amélia Hamburger Flávio Império (Edusp - 1999) e Imagens do Teatro Paulista (Imprensa Oficial do Estado – 1985).
2.      A protagonista foi a atriz Nize Silva (viúva de Osmar Rodrigues Cruz). Que não foi sequer cogitada (nem mesmo convidada) para fazer parte  do “evento que reuniu as atrizes que encenaram peças de Nelson Rodrigues” de segunda-feira (14) sob a curadoria de Rui Castro, incluindo outras que jamais encenaram peça do autor homenageado.
3.      Nelson Rodrigues veio especialmente à São Paulo para assistir ao espetáculo onde foi homenageado com um coquetel e teceu todos os elogios ao espetáculo e, principalmente à atuação impecável de Nize Silva. Registrado em livro do autor, crítico e professor emérito da USP Sábato Magaldi Nelson Rodrigues: Dramaturgias e Encenações (Perspectiva -1987). Como também na biografia de Osmar Rodrigues Cruz em co-autoria com a Profa. Dra. Eugenia Rodrigues Cruz Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro (Hucitec – 2002).
4.      Sendo o curador da mostra uma pessoa supostamente esclarecida, muito nos estranha o esquecimento e a ignorância dos fatos acima, uma vez que eles também constam dos jornais da época e por óbvio deveriam, no mínimo, terem sido convidados a fazerem parte do evento, já que vossa atuação à época deveria fazer parte da memória, inclusive da casa onde ocorre o evento (Teatro do Sesi).
5.      Todas as informações possíveis encontram-se agregadas no Instituto Osmar Rodrigues Cruz, criado formalmente em 2009, bem como no arquivo pessoal de Nize Silva.
(Trecho do email envido ao Sesi pela Dra. Daniella Löw, que não obteve resposta.)




Nize Silva, ao fundo Osmar, e Nelson após o espetáculo

Foto Silvestre Silva

Nize Silva,  Osmar (em segundo plano) e Nelson na plateia após o espetáculo.




“Quando escolhi a A Falecida, Nelson e eu começamos a nos telefonar. Expliquei que as peças encenadas no Sesi têm público enorme vindo das camadas sociais mais baixas da população. Ele ficou entusiasmado, principalmente quando soube que o teatro tinha mais de quatrocentos lugares, acabou autorizando a montagem e quando anunciou no Rio que sua peça seria encenada aqui em São Paulo pelo TPS, soltou mais uma das suas frases: “A falecida não vai morrer nunca!” Reclamou também que a peça ainda não tinha sido levada como ele queria e de todas as montagens feitas a que mais gostou foi a do Antunes Filho, e que mal podia esperar para assistir a nossa. Prometeu vir a São Paulo para a estreia e sentar-se na primeira fila, esperando, desta vez, ver o seu texto bem representado, porque confiava na minha direção. Ele não vinha a São Paulo há muito tempo, mas queria conhecer o meu trabalho, o teatro que não cobrava ingressos e que tinha como público o povo.
(...)
O Sábato Magaldi sugeriu que o Sesi trouxesse o Nelson para São Paulo e ele veio a convite com sua esposa, a irmã, uma enfermeira que ficaram hospedados no Caesar Park. Fazia muito frio aqui em São Paulo, estávamos em pleno inverno, o que é uma verdadeira tortura para quem vem do Rio, e o Nelson não estava muito bem de saúde, estava tomando um monte de remédios!
Á noite fizemos uma apresentação só para ele, que se sentou na terceira fila. Antes de começar eu disse a ele: “Agora Nelson, é com você”. Só fiquei sabendo sua opinião ao final da peça, porque fundi os dois atos da peça em um, portanto não havia intervalo. Ao final ele se levantou e disse: “Parabéns, senhor Cecil B. de Mille”, e continuou fazendo elogios à encenação, aos atores e até gostou da inclusão do cenário. Na noite seguinte estreamos oficialmente, ele voltou a asssistir e participou do coquetel oferecido aos convidados.
(...)
As tiradas do Nelson são inesquecíveis. Na estreia ele fez questão de subir ao palco para cumprimentar os atores, porém, quando de volta à plateia, o contra-regra já havia tirado a escada e ele teve de descer a altura aproximada de uns cinquenta centímetros, apoiado em algumas pessoas olhou para baixo, deu o passo e disse: “Que abiiiiiismo...!”
(in Osmar Rodrigues Cruz – Uma Vida no Teatro – Hucitec 2001, pags 253 a 255)




Foto Silvestre Silva

Trechos de crítica – Jornal da Tarde – por Sábato Magaldi – 26/07/1979
O teatro de Nelson Rodrigues, no melhor estilo. Admirável.
(...) A Falecida é, sem dúvida, a melhor encenação de Osmar Cruz.
(...) O Teatro Popular do Sesi mostrou, em primeiro lugar, um painel histórico da dramaturgia brasileira, e se volta agora para a produção contemporânea. Não houve propósito, deliberadamente didático, mas um profundo amor pelo teatro nacional, de quer, aliás, Osmar Cruz é um dos poucos e reais conhecedores. (...)
(...) Nize Silva tem o seu melhor trabalho em Zulmira. Ela funde as ideias de frustação, de misticismo, de terror em face do desconhecido e de inexorável fatalidade. A “falecida” é uma das personagens que definem com maior clareza o universo feminino de Nelson Rodrigues e Nize Silva a encarna sem deixar de lado um componente. A boa e poderosa voz vai se dosando aos poucos com os acessos de tosse, até o desenlace. Nize compreendeu plenamente a responsabilidade que lhe foi atribuída.
(...)
                                                        Foto Silvestre Silva
Nize relembra em seu Facebook que ao chegar em casa com Osmar, todos os dias pontualmente Nelson Rodrigues telefonava do Rio para falar com Osmar e com ela. E sempre ao final da conversa de como correra o ensaio, ele falava: “Nize, minha Musa, não esqueça do patético!”