sábado, 7 de janeiro de 2012

PROJETO

INTRODUÇÃO


Osmar Rodrigues Cruz foi o criador e diretor do Teatro Popular do Sesi¹ -TPS – durante 40 anos. Essa instituição é singular na América Latina, única experiência vitoriosa para levar cultura, arte e educação a camadas menos favorecidas da sociedade e que não têm condições financeiras de ter acesso à produção do teatro comercial.

Por intermédio de seu teatro popular, o TPS, com ingressos gratuitos, produzia espetáculos teatrais com profissionais de renome e apresentava textos clássicos e modernos para um público, na sua maioria, constituído por operários², com casas lotadas todas as noites.

Enquanto instituição, o Sesi é mantido pela arrecadação da própria indústria paulista. E, desse modo, sujeito a enfrentar dificuldades devido às crises econômicas pelas quais o país passa. A continuidade de seu trabalho, do TPS, portanto, deveu-se sobretudo à habilidade de seu fundador que sempre se empenhou no sentido de manter a instituição fiel aos seus propósitos, mesmo tendo de administrar um orçamento limitado por verbas escassas.

O TPS foi formalmente criado em 1963, portanto, às vésperas do golpe que deu início à Ditadura Militar no Brasil em 31 de março de 1964. Seu principal objetivo era expor à população cultura, arte e educação de uma forma prazerosa, tendo como meta atingir um público não constituído pelas elites, mas sim um público que nunca antes havia sido incentivado a ver o teatro como forma de cultura e participação em decorrência de uma política que promovia alienação.

O TPS teve de buscar meios para cumprir seus objetivos, a despeito dos interesses políticos que marcaram sua trajetória desde sua fundação, uma vez que a Ditadura Militar serviu-se dos mais variados métodos para sufocar qualquer tipo de participação política da população brasileira, valendo-se, inclusive, da oficialização da censura enquanto um instrumento de repressão.

Apesar de todas as condições adversas à concretização de seus objetivos, o TPS buscou conscientizar os brasileiros da sua grandeza, expondo-os à realidade nacional, por intermédio da apresentação de autores nacionais, dos clássicos aos modernos, procurando incessantemente fazer do panorama da dramaturgia um lugar de reflexão da realidade nacional, ainda que tendo de criar meios para evitar a perseguição explícita de uma política de repressão, o que, seguramente, acabaria impedindo a continuidade do seu trabalho.

Mesmo antes da fundação do TPS, seu fundador e diretor, enquanto diretor de teatro amador, sempre teve a preocupação de oferecer um trabalho de maior qualidade ao público e buscou se inteirar da literatura relativa a essa área, movido por sua curiosidade intelectual e científica e por seu espírito investigativo. Infelizmente, essa busca enfrentou uma escassez muito grande de material dessa natureza no Brasil, levando-o a recorrer à bibliografia estrangeira.

Ao longo de 50 anos, Osmar Rodrigues Cruz reuniu um acervo raro que conta com mais de 20 mil exemplares (livros datados dos séculos XVII, XVIII e XIX, manuscritos, coleções numeradas, peças, revistas, etc.).

Afastado da direção do TPS e aposentado por motivos políticos em 1990, seu diretor fundador viu que os objetivos da instituição que criou e dirigiu por 40 anos deixaram de ser uma prioridade para esse tipo de teatro.

Produzindo, hoje, um trabalho muito mais centrado na promoção da própria indústria e preocupado em ocupar um espaço na mídia, o TPS atende mais aos interesses de uma camada da população constituída pela classe média, desviando-se, portanto, do objetivo primeiro que norteou sua própria criação.

A trabalho teatral de criação do TPS, como de toda a trajetória de Osmar Rodrigues Cruz, foi registrado no livro Osmar Rodrigues Cruz – Uma Vida no Teatro pela Editora Hucitec e que recebeu a Bolsa Vitae de Artes em 1999.



MISSÃO

Possuindo uma biblioteca particular formada por um acervo de grande valor que ele não adquiriu com o intuito de ser um mero colecionador, tampouco de comercializar esse material, mas sim, movido unicamente por sua curiosidade intelectual, Osmar Rodrigues Cruz procurou dividi-la, na medida do possível, com outras pessoas, movidas pela mesma curiosidade, permitindo consultas para a realização de trabalhos de pesquisa, tais como dissertações e teses.

Apesar de ver com grande dificuldade a possibilidade de mantê-la, ele jamais pensou na possibilidade de vendê-la, ainda que tenha recebido propostas para isso, pois se o fizesse acabaria por consentir que seu acervo ficasse nas mãos de um grupo restrito. A possibilidade de doá-la para uma universidade, considerando que nenhuma instituição de ensino e pesquisa tenha um acervo de valor igual, teve de ser descartada porque, infelizmente, as universidades não possuem a necessária infra-estrutura para manter um acervo dessa grandiosidade, constituído de obras antigas que não podem ser submetidas à consulta por manuseio, porque isso as condenaria a um fim.

Esse projeto, portanto, tem como objetivo organizar uma biblioteca virtual que, na realidade, terá condições de preservar este acervo para as futuras gerações e, ao mesmo tempo, colocá-lo à disposição de um público maior de pesquisadores tão inquietos quanto Osmar Rodrigues Cruz.

Essa biblioteca atingiria a um público ainda mais heterogêneo pelo fato de poder ser acessada via Internet. A repercussão dessa biblioteca, na difusão do conhecimento, permitiria a continuidade do trabalho que teve início com o TPS, porque, através da Internet, as escolas públicas poderiam expor alunos das classes menos favorecidas à arte e à cultura, permitindo-lhes pensar o teatro como um lugar de participação e não de mero lazer.

Há que se considerar ainda a necessidade de promover esse conhecimento específico junto aos educadores e aos profissionais de áreas que tangenciam com esse tipo de arte, formando profissionais mais críticos e de formação mais sólida, sobretudo em um país como o Brasil.

É fundamental que se considere que desde a sua própria colonização, o Brasil sempre sofreu as conseqüências de uma política que resiste a formar um povo mais consciente de seus deveres e direitos de cidadãos, de seus valores culturais, crítico dentro da sua própria realidade, porque o perfil de um povo não informado sempre foi favorável à manutenção de governos autoritários e à perpetuação de uma política centrada em interesses de elites.



JUSTIFICATIVA

O sistema de educação no Brasil, que vem se democratizando, ainda é muito carente de um ensino mais investigativo, mais pautado na reflexão, voltado para a formação de uma postura crítica. A ausência de reconhecimento mais expressivo, na forma de remuneração de seus professores, acaba não incentivando e até desestimulando o educador a buscar aperfeiçoamento e conhecimento em cursos de pós-graduação, que na verdade são freqüentados por um número muito baixo de pessoas que formam o pico da pirâmide, que tem uma grande base.

Um país onde se tem 40% de analfabetos, 70% de ANALFABETOS FUNCIONAIS e cujo ensino fundamental prima por uma linha de não reprovação é formado por um público carente de conhecimento que não desenvolve sua capacidade interpretativa e crítica. E quando conseguem, têm de limitar-se às instituições particulares, porque as públicas, onde o ensino é de maior valor, acabam se tornando um monopólio das classes mais elitizadas, cujos filhos têm acesso a um ensino de melhor qualidade em escolas particulares. A faculdade acaba tendo de dar conta de resolver as questões adiadas pelos ensino fundamental e médio para nivelar o conhecimento do aluno.

Profissionais com uma formação restrita e muito pouco eclética não buscam o teatro como um lugar de arte e cultura – de formação de consciência – mas sim de lazer.

Uma biblioteca dessa natureza que iria ao encontro daqueles que necessitem de uma melhor formação mudará esse perfil, a médio e longo prazo. O Projeto Educacional inicial visa colocar à disposição de escolas em geral e de Escolas Públicas do Estado e Município em particular, além das universidades e escolas técnicas, uma enorme fonte de conhecimento de qualidade inclusive atraente, porque o teatro sempre desperta um gosto especial. A médio e longo prazo favorecerá as escolas permitindo-lhes conhecer o funcionamento do teatro, favorecendo a criação de grupos de teatro e, finalmente, permitindo que o teatro seja um lugar de aprendizado da própria língua e do conhecimento do potencial de expressão de cada um, criando um intercâmbio com os próprios estudantes de Artes Cênicas para que sejam despertados para o valor do teatro popular como formador de consciências mais críticas, tomando-o como um meio e não simplesmente como um fim.



PROJETO EDUCACIONAL 
Quando tanto se fala na diversidade de linguagens, atualmente, predominantemente visuais, mais se torna necessária uma visada atenciosa ao texto escrito. Foi dele que tudo se originou, todo progresso, todas as linguagens, todas as expressões. A literatura proporcionou durante séculos que a percepção do mundo fosse aguçada pelo leitor reconhecendo-se no próprio texto por ele lido. A dialética existencial sempre se deu por meio dessa comunicação tão peculiar que é a literatura.
O texto teatral, a dramaturgia ou a literatura dramática também inclusas na literatura, é sempre preservado, mesmo que não visto, na leitura de peças, seja pelo “espectador-leitor” solitário, seja através das chamadas leituras dramáticas.
Portanto, o texto teatral jamais perderá sua importância e sua posição no teatro, mesmo que a figura do dramaturgo como contador de histórias e crítico social de seu tempo tenha sido questionada através dos anos. O texto no teatro ganha sua posição de peça teatral quando é falado, pois teatro se faz no palco, na ação.
Este projeto visa primordialmente destacar nossas raízes dramatúrgicas, tão esquecidas, como pretexto para o ensino multidisciplinar de nossos costumes, de nossa história, de nosso país. A pouca importância que se dá à comédia predominantemente na dramaturgia nacional, tomando-a quase sempre como gênero menor, faz com que sejam esquecidos nossos verdadeiros valores e nossa tendência maior para a arte de fazer rir. A criança e o adolescente tomarão em suas mãos seu próprio passado e somente assim poderão realizar seu presente.
O Instituto Osmar Rodrigues Cruz, por meio de sua Biblioteca fornecerá, paralelamente à indexação do acervo de teatro brasileiro:
1 - treinamento para professores de Português, Literatura, História do Brasil, Artes e outras disciplinas que sejam convenientes ao objetivo proposto;
2 - textos dos dramaturgos Martins Pena, que criou o teatro brasileiro e França Junior, ambos legítimos representantes do nosso teatro de costumes;
3 - acompanhamento das oficinas propostas aos alunos, bem como material sobre: história do teatro brasileiro e técnicas de teatro e montagem.
O teatro brasileiro nasceu de um educador, o Padre José de Anchieta e tem até hoje a função de promover a integração social e cultural, suscitar a criatividade e acima de tudo educar.
As escolas regulares de Primeiro e Segundo Graus, particulares ou públicas, ainda têm pouco interesse em inserir disciplinas que desenvolvam a arte, sejam elas teatro, música ou artes plásticas. Há uma grande dificuldade dos próprios professores em reconhecer a importância dessas disciplinas como fundamentais para o desenvolvimento da multidisciplinaridade e como complemento da interdisciplinaridade. Essa inserção propiciaria ao aluno um aprendizado e um desenvolvimento global mais eficaz, mostrando que ele está inserido no mundo em que vive, onde aplicará o que irá aprender. Além disso, compondo com outras disciplinas situações novas para o aluno, seria um fator de pesquisa e maior aprendizado.


O Projeto Educacional será executado pela Presidente do Instituto Eugenia Rodrigues Cruz, atriz do TPS durante 20 anos, Graduada em Filosofia (PUC-SP), Mestre e Doutor em Artes (USP), ministrou Oficinas de Teatro durante 10 anos. Co-autora junto a Osmar Rodrigues Cruz da biografia dele.



¹ Serviço Social da Indústria
² O TPS distribuía ingressos aos operários nas próprias fábricas

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