domingo, 14 de outubro de 2012

Volta à cronologia.


Prêmio Arlequim Melhor Diretor
CRÍTICA -  JORNAL O TEMPO - COLUNA PALCO - POR ATHOS ABRAMO - 09/12/1954

Festival de Teatro Amador III

A representação de “As guerras do Alecrim e da Manjerona”, pelo Grêmio da Caixa Econômica Federal, constitui uma das mais importantes manifestações do Festival, não somente pelo que significa, no plano cultural, a exumação dessa peça do nosso teatro clássico, como ainda pela inteligência com que foi encenada e pelo êxito positivo alcançado pelo espetáculo. Embora dentro da modéstia que o amadorismo comporta, o tratamento dado pelo diretor, Osmar Rodrigues Cruz, foi dos mais eficazes e válidos teatralmente falando, e poderá servir como ponto de referência  para futuras edições.  Sabe-se quais dificuldades Antônio José da Silva acarreta para uma representação integral, no texto e na cenografia. Essas dificuldades foram resolvidas com brilho, ao adotar-se um esquema cenográfico de interiores muitos simples e sóbrios, e de exteriores supridos por cortinas pintadas, ou melhor, desenhadas. O efeitos de tais cortinas, de autoria de Francisco Giaccheri, foi dos mais genuinamente teatrais e sua aplicação, assim como certos expedientes de mudança direta de cenários, executados pelos próprios atores em cena, juntamente à viva mobilidade da recitação, revelaram o bom e adequado aproveitamento da recente lição proporcionada  pelo “Picollo Teatro” de Milão em “Arlequim servo de dois amos” e em “Júlio César”. A direção de Osmar Rodrigues Cruz foi uma das mais seguras acontecidas no Festival, e caracterizou-se pela atenção dada ao aspecto filológico da peça, enfrentando não somente sem escamoteações, mas mesmo com apaixonada competência. O espetáculo foi dirigido no sentido de atingir-se a maior leveza e rapidez de recitação possível em elementos não afeitos às representações diárias como são os amadores, e isso foi conseguido, apesar de algumas falhas do elenco. Deste temos a assinalar primeiramente, a ótima dicção de Carlos Henrique Silva, no papel de Semicúpio. Dotado das necessárias agilidade e mobilidade físicas, agindo numa marcação sempre segura e viva, esse amador foi uma revelação. Prejudica-o muito um leve defeito de dicção, defeito que impede infelizmente seja ele considerado como um dos melhores atores da comédia do Festival. Mesmo assim, tenho uma grande fé no futuro desse rapaz, cuja mocidade, resistência e energia recitativas a justificam plenamente. Tudo dependerá, no entanto, da eliminação de seu defeito de pronúncia. Cora Gurjão Cotrim, no papel de Sevadilha, foi por sua vez digna “partner” de tal Semicúpio. Muito jovem, dotada de um físico adequado e de uma voz da mais cristalina musicalidade, e senhora de uma dicção perfeita, também essa moça poderá representar uma esperança, no caso em que puder estudar  e corrigir-se de certa instabilidade e precipitação no jogo cênico. Joaquim Mário Sonetti, no papel de Lancelote; Maria Quadros Malta, no papel de Dona Cloris; Moisés Leiner no de Tibúrcio, foram os outros elementos que tiveram atuação correta e realmente muito eficaz nas cenas cômicas. Ao grupo todo do Grêmio da Caixa Econômica Federal vai um caloroso aplauso pela coragem demonstrada em levar para a cena a trabalhosa e talvez envelhecida, mas genial peça do Judeu. E uma exortação a continuar nesse caminho: o da exumação de nosso pequeno mas tão significativo repertório clássico.
(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)       

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