COLUNA TEATRO - DIÁRIO DE SÃO PAULO - POR NICANOR MIRANDA - 03/09/1955
“Revista do Teatro Amador”
Elevado é o número de amadores em nosso Estado. Raro é o município que não conta com um grupo de pessoas que gostam de teatro e que realizam, pelo menos de longe em longe, um espetáculo. As dificuldades que a maioria dos amadores encontram para satisfazer a sua inclinação e vocação dramática não são pequenas e nem poucas. As mais efetivas, talvez consistam em dois fatos notórios; não conhecerem peças que se prestem aos seus espetáculos e não terem meios de encontrar ou adquirir as que servem. A bibliografia nacional, segundo Lopes Gonçalves que está procedendo um levantamento de tudo que existe, anda pela casa das dez mil peças. Evidentemente nessa dezena de milhares existe muito bagaço e pouco suco. Mas o que sobra muitas vezes não é fácil de encontrar no mercado livreiro. Quanto às estrangeiras, os amadores são geralmente criaturas atemorizadas com o bicho papão da SBAT, que não tem a mínima condescendência para com os amadores e nem procura ajudá-los desta ou daquela maneira. Faltam-lhes ainda encenadores, faltam-lhes cenógrafos... para auxiliá-los com eficiência nas realizações de seus espetáculos. A bem dizer, falta-lhes quase tudo, exceto boa vontade e paixão pelo teatro.
Diante de tais obstáculos, nada melhor poderiam eles ter feito do que se congregarem, reunirem-se em uma associação que cuide de seus interesses. Tal medida já foi posta em prática com a fundação da Federação Paulista de Amadores Teatrais, sob os auspícios da Associação Brasileira de Críticos Teatrais de São Paulo. Os resultados não demoraram a aparecer. Graças a Federação, os amadores já realizaram um festival e um congresso. No momento preparam outros dois para o mês vindouro. Além disso, instituíram um interessante concurso de crítica anual, do qual não podem participar, é óbvio, os profissionais militantes na imprensa paulistana.
Mais uma bela iniciativa acabam de tomar, recentemente, editando a “Revista do Teatro Amador”, cujo primeiro número foi publicado no mês de agosto findo. A revista é modesta e despretensiosa, mas o seu objetivo capital é inteligente e merece ser elogiado: “O teatro amador em nossa terra e particularmente em São Paulo, embora a sua evolução marcante, não possui um núcleo que irradie a arte de representar, propagando-se e realçando-a. Assim sendo, as sociedades, pelos seus grupos teatrais, encontram-se individualizadas e seus trabalhos não têm a repercussão requerida, por não serem divulgados. Portanto, fazia-se mister que um porta-voz unisse os elos que encerram as coisas teatrais, formando assim a cadeia sólida e coesa para demonstrar e evidenciar o valor da arte cênica”.
A missão dos amadores não é somente difundir o gosto pela arte dramática nas camadas populares. É também uma missão educativa, de mérito indiscutível, tão explícita que dispensa esclarecimentos. Que não arrefeçam em seu entusiasmo, que não desistam de lutar contra todo e qualquer empecilho que lhes surja no meio da jornada. Assim agindo, não tardará o tempo em que os amadores paulistas serão, além de rico celeiro do teatro profissional, idealistas dignos de admiração e respeitáveis cultores de uma arte milenária que apaixona cada vez mais os homens dos cinco continentes.
(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)
(in Osmar Rodrigues Cruz Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)