Um dicionário estabelece que representar é “mover a ação”; que
representar um papel é “manter o papel de um dos personagens numa peça teatral;
por isso, simular, fingir”; e o personagem é “aquilo que uma pessoa ou coisa
realmente é”.
Muito nestas definições é valioso, porém algo é desprezado.
Realmente, o desempenho denota ação, e o personagem a realidade essencial de um
indivíduo. Mas, o desempenho não é simular ou fingir. Esta noção falsa
obscurece qualquer verdadeira compreensão da teoria e da prática da Arte. Além
de simular ou fingir, o desempenho é viver em termos do teatro. O teatro
concebe a vida em relação a seus próprios objetivos, de acordo com suas e
próprias leis imutáveis. Estas leis são que um personagem será ouvido, visto e
sentido em termos que a plateia possa apreciar o comportamento dele. Apesar
dessas leis serem baseadas fundamentalmente nas leis naturais, são convenções
criadas pela verdadeira natureza do teatro médio.
Representar, portanto, pode ser definido como aquele processo em
que o ator concebe o personagem e revela-o perante a plateia. Concepção e
revelação: - eis que toda a arte pode se resumir nestas duas palavras.
Não há menção como o ator se orientará ao longo da difícil estrada
da criação do personagem? Naturalmente que sim, pois há tantos métodos de criação
do personagem quantos atores, diretores, produtores e teatrólogos existem. Esta
tentativa é bem uma outra opinião, como nenhuma análise por escrito pode ajudar
a esclarecer totalmente uma arte ao mesmo tempo viva e efêmera.
Em primeiro lugar, o ator sincero desejará compreender
definitivamente quais são os seus problemas e, em segundo lugar, trabalhará
para solucioná-los. Aliás, o desempenho será quando muito acidental, acertado
ou falho, e levará a voos incertos de inspiração. À pergunta: Como pode o ator
ser personagem? A resposta é que ele não pode, pois se, por milagre, puder
sê-lo, será um maníaco, e o teatro não é lugar para maníacos. Mas esperem! É o
personagem de carne e sangue ou é imaginário? Não é um fantasma vivo num mundo
de visão? E não julga habitar o corpo de carne e sangue de um ser humano real,
de modo a viver no teatro?
Esta obliquidade é animadora. Como pode o ator tornar-se personagem
em termos teatrais? Em primeiro lugar, quais são os elementos do teatro? O
texto, o ator, a cena. Provavelmente a lei mais fundamental de qualquer arte, e
esta é em especial a verdadeira para com a arte teatral, é aceitar, jamais
rejeitar a matéria da qual a criação final tem de ser concebida. Não como a
maioria dos atores, em que o desempenho requer seja a sua própria matéria.
Concebe sua criação com ele próprio, como um meio. Em seguida, como identificar
tudo do ator, com esse ser imaginário que é o personagem? O ator que tem ainda
de preparar-se tecnicamente, não estará preparado para tal identificação.
Antes, pode conhecer um personagem que deve conhecer-se a si próprio.
Consequentemente, ele fará o seu corpo forte e sadio, sua voz clara e ressonante
e a sua fala incisiva e articulada. E ele fá-los-á corresponder perfeitamente
ao seu espírito, à sua imaginação e aos seus sentimentos.* Somente após esta
fase de auto conhecimento ou, pelo menos, até que esta parte do seu preparo
esteja bem adiantada, é que o ator está preparado para a fase do seu personagem
conhecido.
*(nota do autor) Estou reservando a natureza desta técnica
preliminar e o preparo criador para outra obra.
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