O movimento
Presumivelmente,
a preparação preliminar, técnica e criadora, do corpo desenvolveu a coordenação
da cabeça, do tronco, dos braços, pernas e pés. O corpo é treinado para
comportar-se como uma unidade flexível, relaxada e sensível na sua
correspondência (harmonia) com a imaginação. O ator aprendeu como andar,
sentar-se, mover-se, em suma, utiliza o seu corpo com desembaraço e
graça, muito acima da negligência casual da vida cotidiana.
Talvez a
parte mais importante da base física do ator seja a face. A adequada e
apropriada estrutura facial, no entanto, é importante. Através de nossas ações
e reações são refletidas nas expressões da face: os maxilares, os lábios, os
músculos faciais, o nariz e, acima de tudo, os olhos. No palco como na vida, é
particularmente através dos olhos que os pensamentos e os sentimentos do
personagem são perceptíveis. Com aptidão foram descritos como os espelhos da
alma. Muito da concentração do ator depende de que e como ele vê e ouve o que
está acontecendo em torno dele. Os olhos, bem como os ouvidos desempenham o seu
papel estabelecendo as reações auditivas do personagem. A observação na vida
dos olhos de um espião revelará como procura uma pessoa que pode ser ou não uma
questão de assunto de uma conversação.
De fato,
as mãos são os agentes mais importantes, que adquirirá as propriedades
extraordinárias para o ator. Por meio delas ele experimenta a sensação do tato.
Das atividades mais familiares, o ator estará apto com facilidade a riscar um
fósforo, acender ou apagar um cigarro, atar ou abrir um pacote, abrir ou fechar
um livro, uma porta ou uma janela, colocar ou tirar um aparelho de lavar roupa,
tomar um drink (ser cuidadoso quanto à água carbonizada é aquecida pela garrafa
de água “seltzer”), apanha um copo, e cento e uma ações comuns que ocorrem na
vida diária.
Se essas
atividades familiares cotidianas provocam peças embaraçosas no palco, como elas
frequentemente fazem, em virtude das condições artificiais sob as quais são
representadas, as atividades mais difíceis e complicadas serão praticadas e
ensaiadas com inclusive um cuidado maior. Tome, por exemplo, o ato de
barbear-se (o barbeiro barbeia Napoleão em “O Barbeiro de Napoleão”), enrolando
um cigarro com uma mão ou arremessando um laço (ambos foram dominados pelo
Franchot Tone, num período de uma semana, através do “cowboy” (vaqueiro) levado
na apresentação de “Verdes crescem os Lilases” no Teatro Guild), e devorando
uma refeição com grande pressa (Albert, Levene e Loeb fazem-no em dois minutos
insípidos, em “Serviço de Quarto” (Sala)).
As mãos
e os braços são também empregados na gesticulação, de maneira a destacar ou
ajudar a purificar a pronúncia vocal. De fato, o gesto será ditado pelo estado
social, nacionalidade e situação direta do personagem. Quer seja das mãos, dos
braços, da cabeça, do tronco, das pernas e pés, a aptidão, a economia e a
liberdade caracterizarão todo gesto.
O corpo
veste roupas. As roupas caracterizam o homem (pelo menos externamente) e
refletem a época, o gosto e a profissão do personagem. Poucos são os atores que
podem vestir roupas bem, em virtude de não tornarem o vestuário uma parcela de
si próprios. Eles comportam-se (e isto é particularmente verdadeiro nas peças
de época, quando o vestuário é muito diferente do de nossa própria época) como
se o traje fosse algo estranho, e divorciado daquele que o use. Uma compreensão
do período em que a peça se baseia, a construção do traje especial, o gosto e a
situação do personagem, e uma verificação do que as roupas são feitas para
serem gastas (estropiadas) e usadas, dará ao ator uma maior liberdade no
emprego de seu físico no palco.
O
movimento na vida começa com as necessidades criadas pelo nosso ambiente direto
de pessoas e coisas, num lugar. Quando só num quarto (geralmente encerrado
dentro de quatro paredes) nós nos movimentamos casual ou significativamente,
gratuita ou toscamente (de um modo mal ajeitado), à medida que a situação
exige. Pois quando nós estamos sós nos comportamos a fim de nos adaptarmos a
nós próprios. Quando entre outros, logo nos tornamos mais cuidadosos na
maneira de nos comportarmos. Tal comportamento variará de acordo com a natureza
daqueles que estão presentes. “Cada um de nós – diz o Pai nos “Seis personagens
à procura de um autor” de Pirandello – quando aparece diante de seu amigo
reveste-se numa certa dignidade. Mas todo homem sabe que coisas inconfessáveis
passam dentro do íntimo de seu próprio coração”. Quando, no entanto, estamos
com outrem, nos comportamos não apenas em adaptarmo-nos a nós próprios, mas se
somos considerados, nos comportamos de modo a adaptarmo-nos a nós próprios, mas
se somos considerados, nos comportamos de modo a adaptarmo-nos a esses outros.
A isto nós damos o nome de cortesia.
Como na
vida, assim no teatro, o movimento é a correspondência individual com o
ambiente direto das pessoas e das coisas, num lugar. Fora isso, as pessoas (os
personagens) e as coisas (adereços de teatro) num lugar (a cena), a parte mais
importante do ambiente direto do teatro é a plateia. Uma plateia (a vida) é
permitida ver, ouvir e sentir uma ação imaginativa entrosada (a arte).
Portanto, como o fator plateia não ocorre na vida nem é a quarta parede
removida, o ator não pode movimentar-se no palco precisamente como seria na
vida. O ator não está nunca só no palco, porque a plateia é uma testemunha
silenciosa ao drama. Porque deve considerar uma plateia vendo, todo movimento
no teatro deve confinar-se às leis da vida modificadas de maneira a adaptarem-se
as óticas do teatro.
O que,
mais especificamente, são as exigências feitas pela plateia, observando o
físico do ator em movimento? O movimento é visto. Os olhos assistirão àquele
movimento que é rítmico. Contemplar o movimento rítmico é satisfazer o sentido
da visão. Tal movimento é rítmico, pois tem um começo, um meio e um fim, porém
onde começa e o outro termina é um dos mistérios da natureza.
Ele
desafia a análise. O ritmo é sentido. Caracteriza-se pela perfeição. De fato,
pode haver interrupções em relação a qualquer ritmo determinado, mas estas servem
para fortalecer o ritmo particular que precede ou acompanha. Portanto, como é
mais difícil ser rítmico quando existe muito movimento, o ator fará bem em
reduzir seu movimento ao mínimo, escolhendo apenas tais movimentos que
comunicarão melhor a essência do comportamento do personagem. Mas se muitos ou
alguns, os movimentos do ator devem ter unidade e foco. O movimento unificado e
focalizado obriga a atenção. O movimento dependerá de quanto o personagem possa
ser ou não importante, estabelecendo a existência de qualquer situação
determinada. Se o personagem é vital à cena, seu movimento ou falta dele
dominarão a atenção da plateia. Se não é vital à cena, o movimento não
distrairá a atenção daqueles personagens que o são, porém o ator compreenderá
que o seu físico, mesmo quando não em movimento, permanecerá sempre expressivo
e dinâmico. O movimento do personagem individual será sempre motivado pela ideia
da peça num determinado momento. Pode ser importante ou não, como o caso o
possa ser, mas mesmo quando importante, a importância é sempre relativa e
contributiva, dependendo da ideia da peça, da caracterização, onde e com quem o
personagem está, e por que.
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