TRECHO CRÍTICA – TRIBUNA DA IMPRENSA (RJ) – POR
FLÁVIO MARINHO – 09/03/1976
Um Putz nem tão absurdo
Segundo Luigi Pirandello – autor
sugerido pela leitura de Putz de
Murray Schisgal – “não pode haver nenhuma
verdade, já que a verdade varia de acordo com o indivíduo e as circunstâncias;
não pode haver comunicação, pois as palavras enunciam o que parece ser e não o
que realmente é; não pode haver sanidade pois sanidade exige estabilidade, o
que não se encontra na condição humana”. Partindo desta proposta básica, parece
estar a chave da maioria das respostas às questões apresentadas pelo atual
cartaz da Maison de France. Pois é dentro desta perspectiva de mensagens
não-definitivas, limitadas pela teoria da relatividade, que o autor monta seu
texto. Onde aborda, entre outros temas, o amor, casamento, autopiedade,
desespero, suicídio ou homossexualismo. Para isso, concedeu-lhe um tratamento
de algum parentesco com o teatro do Absurdo que, no entanto, tem mais a ver com
uma comédia humanística de nonsense à la Irmãos
Marx. Dentro desta ótica, o amor, por exemplo, não chega a ser definido por
Schisgal; ele prefere denunciar o mau uso e o desgaste de tal sentimento nas
sociedades tecnológicas que o utilizam como desculpa para insinceridade, desejo
físico ou chantagem emocional. Para Schisgal, o importante é mostrar a visão
destorcida do amor – vendida em livros ou filmes baratos – que o transformou
numa comodidade em vez de uma verdadeira emoção. Dessa forma, o texto se
desenvolve por meio de três únicos personagens que simplesmente vão jogando
suas idéias, sem se preocupar em coordená-las – e talvez por isso os três dêem
a impressão de beirar a insanidade. Mas apenas a impressão, já que, relembrando
Pirandello, “não pode haver sanidade, pois sanidade exige estabilidade, o que
não se encontra na condição humana”. O maior mérito de Schisgal talvez esteja
no fato de que mesmo abordando um tema dramático como a loucura contemporânea
enlatada pela sociedade de consumo, Putz
consegue se realizar como uma divertida comédia. Nela, Schisgal ironiza os lugares
comuns provocados pelo desgaste do amor, goza o self made man americano, o feminismo, além das patéticas situações
criadas por ele mesmo. O resultado embora algo pretensioso, senão chega a ser
hilariante, pelo menos não nos conduz ao universo dos bocejos.
A competente direção de Osmar Rodrigues Cruz
aproveitou o potencial humorístico dos lugares-comuns do texto e partiu para
farsa rasgada. Acertou no alvo quanto ao ritmo, no tom exasperado e na
limpeza de desnecessários toques
absurdos.(...)
(in Osmar Rodrigues Cruz - Uma Vida no Teatro Hucitec 2001)