sábado, 20 de dezembro de 2014

A EXPRESSÃO NO TEATRO 1



A natureza da expressão na vida e na arte

Dissemos que quando um personagem está vivo imaginariamente, encontrará uma expressão mais forte através do corpo e da voz do ator, certamente proporcionados, pois estes são treinados a obedecer à imaginação. Mas dissemos muito pouco, no tocante à natureza de sua expressão. O nosso problema agora é: que forma tomará o corpo do ator e a voz do ator, de maneira a tornar um personagem vivo no teatro? Pois, você recordará, nós definimos o desempenho, como um modo de viver, em termos teatrais.

A resposta a esta questão dependerá amplamente das diferenças entre a natureza da expressão na vida, tão confrontadas com o teatro. Na vida a expressão prossegue em todo o instante de uma existência. Pode ser durante um dia, até cem anos ou mais. A vida – como a conhecemos – é contínua durante o tempo em que estamos vivos. Tanto quanto sabemos, a expressão cessa com a morte. Porém, em teatro, a expressão prossegue enquanto existe a peça, o que quer dizer durante duas horas e meia. O personagem recobra os sentidos às 8 e 40, continua vivendo durante o tempo em que está na presença da plateia, e então morre com o cair da cortina, vivendo, depois disso, somente na memória daqueles que testemunharam tal representação.

Como foi o autor capaz de realizar o difícil feito de viver a vida artística no curto espaço de duas horas e meia, em relação aos personagens e fatos que, na vida, exigirão anos e anos? Escolhendo apenas os traços significativos do personagem e a circunstância, e banindo do espírito o fortuito. Tudo na peça – cada mínimo detalhe, mesmo só o que pode parecer casual – é significativo. No instante em que falte a significação em qualquer uma de suas partes, a peça torna-se deficiente e pode ser completada no local do débito do epitáfio artístico. Dentro da peça em si, existem verdadeiros momentos de significação maior ou menor, mas mesmo esses momentos menores, nem por isso, significativos se confrontados com a vida. Quando o ator faz o personagem e a situação típica universal, a peça torna-se significativa no conteúdo. Quando ele dominado tal forma de construção da peça que melhor exprima esse conteúdo significativo, a peça torna-se significativa na forma. O conteúdo e a forma são mais significativos quando a elevada maioria de qualquer plateia determinada, melhor compreenda, aprecie, simpatize e seja movida pelos personagens e episódios. Isto a assistência não pode fazer se, inicialmente, a peça tratar com os personagens e episódios estranhos, em relação aos quais a vida do público ou as experiências imaginadas, ou se, em segundo lugar, a peça é defeituosa na sua construção técnica de enredo ou disposição das palavras. No entanto, muitos o contradizem, nós chegamos mais cedo ou mais tarde à conclusão inevitável de que uma peça é um jogo atribulado da vida filtrada através da imaginação do artista. Como consequência desse processo de filtração, o personagem e a situação, e sua expressão na forma, são necessariamente condensados.

Tal condensação do personagem e do acontecimento é talvez a lei mais fundamental do teatro. Como já foi estabelecido é uma condensação tornada necessária, visto que o tempo na vida difere do tempo na arte. Aquele é o tempo do relógio e é real, este, psicológico e imaginário, mas no entanto real também. Visto que deve se apegar às exigências do tempo na arte, o Autor comprime o tema de sua peça dentro de duas horas e meia. Este fato é que explica por que ele teve de ser seletivo, significativo, típico e universal na disposição e expressão do conteúdo e forma da peça. Como o teatrólogo, o ator deve ser igualmente seletivo em sua assimilação do conteúdo do personagem e em sua expressão na forma. Deve exprimir-se em termos pungentes dentro do mais curto espaço de tempo possível. Deve ser significativo em sua expressão, porque o teatrólogo o foi na dele.

A verdadeira natureza do teatro rege a expressão teatral. Um teatro está onde as pessoas (a plateia) vão para ver e ouvir outras pessoas em personagem (os atores) viver a ação (a peça), concebida originalmente na imaginação do autor, e apresentada no palco (a cena). Talvez mais do que qualquer outro fator, a presença de uma plateia é responsável pelas leias e convenções que regem a conduta no teatro. É para aqueles que ocupam os assentos do teatro que a peça é apresentada. Eles são os principais beneficiários e vêm para aceitar a peça. A recepção será ativa ou passiva, de acordo como são movidos pelo que veem e ouvem. Estão para aprender o que contém a peça, particularmente através dos sentidos da visão e da audição – os outros sentidos (o tato, o gosto e o olfato) trabalhando para a maior parte na imaginação. Aqueles confiados à comunicação da peça com a plateia são a cena e o ator. A verdadeira vida da peça depende de como eles satisfaçam a sua sagrada confiança. Não a satisfarão se a plateia não atentar para o que vê e ouve. Como na vida, assim no teatro, nossos olhos e ouvidos atentam para o que satisfaz. Se estes na plateia são para prestar atenção à peça, deve o ator criar em si aquelas condições que o tornarão fácil e satisfazendo-os, ao assistir. Que condições são essas? Que forma de expressão captará melhor a atenção de uma plateia? Como comportar-se-á o ator se tiver de dominar irresistivelmente a atenção daqueles que se sentam no auditório? Isto leva-nos ao físico do ator em movimento, à sua voz e linguagem, ao sentimento, à concentração, ao relaxamento e à inspiração. (ORC)


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