TEATRO NACIONAL POPULAR BRASILEIRO
(TNPB)
As obras de Antônio José – Introdução I
A tolerância pelo judaísmo foi um dos
princípios que a paz na Holanda parecia haver imposto ao fanatismo religioso
dos portugueses. Dentro em pouco, porém, essa conquista da consciência livre
não tardou a extinguir-se. Logo nos começos do século XVIII desenvolve-se
enérgica perseguição aos judeus que viviam no Brasil; os agentes da Inquisição
aqui trabalham ativamente contra a raça desditosa que havia crescido à sombra
do Brasil holandês e, por toda parte, mormente na Paraíba e no Rio de Janeiro o
zelo dos Dominicanos recobra nova energia.
Antônio José nascera no Rio de Janeiro, a 8
de maio de 1705, e era filho do advogado João Mendes da Silva e de D. Lourença
Coitinho, de cujo consorcio vieram ao mundo três filhos André Mendes, Baltazar
Rodrigues e o mais jovem dos três, Antônio José.
Por esse tempo instituíra-se a caça aos
judeus e muitas famílias foram levadas a Lisboa por denuncia e intimação dos
familiares da Inquisição.
Havia nesse zelo ao mesmo tempo fanatismo e
roubo porque as famílias que mais morreram foram sempre as mais abastadas e
aquelas que podiam deixar, pelo confisco, as riquezas que a humildade cristã
vesgamente invejava. A sociedade parasitária e aladroada que já havia saqueado
África e Índia e por inépcia esgotado os tesouros que não soube valorizar, ia
ressarcindo pelas garras da fé o que lhes haviam perdido o desmazelo e a
ignorância.
E, assim, como muitas outras foi obrigada a
embarcar para Lisboa a família do advogado João Mendes da Silva. E nunca mais
voltou a colônia. A esposa do advogado, a mãe de Antônio José, não podia
afastar-se de sob a vigilância dos Inquisidores, tendo sido várias vezes
acusada de judaísmo.
“O pequeno Antônio José começou em Lisboa
sua educação, enquanto a mãe sofria os tratos do Santo Ofício por cristã nova”.
– Afinal a pobre foi solta; mas é muito provável que o ferrete de judaísmo, com
que se estreavam na Corte, limitasse o círculo de suas relações aos de sua
igualdade. E o jovem Antônio José, ainda que batizado na Sé do Rio de Janeiro,
vendo-se agora só rodeado de cristãos novos perseguidos, e de judeus, foi-se
imbuindo das doutrinas destes, até que as professou.
“Foi a Coimbra estudar Cânones, e nem por
isso mudou de crenças. Em 1726 estava de volta em Lisboa: e já advogava com seu
pai quando aos 8 de Agosto foi agarrado para os cárceres da Inquisição. Tinha
então 21 anos de idade, e o susto que lhe souberam incutir, e o modo como
puseram em contribuição seu gênio dócil, fizeram que ele não só se descobrisse
aos Inquisidores culpado, como delatasse alguns cumplices. No exame de Doutrina
que lhe fizeram errou alguns pontos. Sendo, porém a final, posto a cruéis
tratos de polé sem nada mais revelar, propôs-se a fazer decidida abjuração; e
aceita esta foi solto no auto público do mês de Outubro. No sofrimento dos
tratos, que puseram o padecente na impossibilidade de assinar o seu nome, os
Inquisidores tomaram nota de que o abjurando gritava por Deus, e não pela
Virgem ou santo algum!”
Esta conjuntura da sua vida merece ser
tratada com maior individuação.
A história, com as circunstancias da prisão
de Antônio José é a seguinte. Um dia três familiares de Santo Ofício intimam o
poeta a comparecer perante o Tribunal.
Filho de família suspeita de heresia judaica
era natural que todos os seus passos fossem vigiados.
(continua)
OSMAR ESPECTADOR
Coleção de Programas de Teatro das décadas de 40 e 50