2ª etapa: O personagem.
“Background”, e a importância da fé, da coragem e humildade.
A segunda fase da criação do personagem é também dedicada à
concepção. Agora ele se concentra no personagem. Se for cuidadoso, estudará
também outros personagens, porque conhece as vidas do personagem num grupo.
Como o personagem depende de sua estrutura constitutiva fundamental e de seu
ambiente passado e atual de pessoas e coisas. A semelhança é muito importante
durante esta fase. Se o ator quer compreender completamente o personagem,
deve ter fé, coragem e humildade.
A fé é talvez a mais importante das três. A fé dá plasticidade ao
“eu” espiritual e material do ator. A fé dá-lhe esperança em ser bem sucedido
no final. A fé empresta voos à sua imaginação. A fé torna-lhe o trabalho
sólido e gosta dele. Mas a fé não deve se confundir com vaidade. Porque do seu
senso de superioridade o ator vaidoso raras vezes cria um personagem
verdadeiro.
Se a fé cria as imagens, a coragem dá ao ator força para
executá-las. Não obstante a execução externa não tenha
ainda principiado, a coragem guia-o para provar o mais intrínseco no ser do
personagem. “O ator verdadeiro – diz Jehlinger – deve possuir a coragem de um
leão e a sensibilidade de um cordeiro”. Deve ousar, fazer, pensar e sentir tudo
nesta fase.
A terceira qualidade é a humildade. O ator deve perseguir o
personagem com humildade, se quer descobrir-se nele. É a humildade que torna
o personagem um amigo. Ele vai até o ator somente se o ator for até ele.
Aliás, ele aspira ter tudo a fazer com ele. Ala Nazimova assemelha o personagem
com: “Eu não sou nada. Eu não sou ninguém”.
Tendo conquistado a amizade do personagem, o ator achá-lo-á muito a
fim, pronto e desejoso de confiar-se. Ele introduzir-se-á, diz o seu nome ao
ator, e vigia-o muito cuidadosamente. Ele quer ainda confiar o ator
completamente. Quanto mais ansioso o ator quer conhece-lo, mais depressa o
personagem toma dimensões físicas, e o ator começa a ouvir o som de sua voz e a
qualidade da sua linguagem. O personagem exprimir-se-á por si. Mas ele vai de
um assunto para outro, raramente seguindo por completo um fio de pensamento.
Vagueia ao longo. Ele pode falar de suas aspirações, suas atitudes mentais, sua
educação, seus hábitos, seus orgulhos, sua natureza emotiva e das maneiras
pelas quais ele reage aos fatos, situações e condições diferentes. Ele nada
sabe das situações na peça, porque está construindo o “background” do qual se
produzem as situações. Consegue cada vez mais confidências. Diz coisas sobre si
que podem assustar o ator. E mais! Agora, começa a vivê-las confundir o ator. Mas este escuta tudo, sabe e
vigia tudo que ele faz. TUDO! Por sua vez, o ator revelou o que um personagem
tanto nele confiou. Em primeiro lugar, porque o ator escutou-o atentamente; e,
em segundo lugar, porque acreditou no personagem, implicitamente. O
personagem jamais repousa. Pouco a pouco, ele terá dado ao ator toda a
matéria prima da sua existência. Desta matéria, o ator como o autor seleciona e
urde as teias mais significativas, num modelo artístico. Somente após o ator
imbuir-se de tudo do personagem, é que pode avaliar qual o papel do personagem
apresentado na peça. Para o autor, de acordo com Pirandello, expõe apenas tanto
quanto for necessário a peça, tomando em consideração os outros personagens, e
toda vez insinuando a vida interior irrevelada de cada um.
Após estes tratamentos preliminares com o personagem, o ator faz
certas indagações sobre si. Que parcela de sua estrutura, interna ou externa,
está conforme o personagem, e qual não está? Especialmente a interna. Trabalhar
na externa, vem em seguida, mais tarde. Uma vez que as estruturas interna e
externa do ator e do personagem estejam identificadas, o trabalho sólido cessa.
“Metade da batalha do ator está ganha – acredita Helen Hayes – uma vez que um
retrato fiel do personagem está firmemente gravado em seus sentidos”. Senão, por
que treinou o corpo e a voz para corresponder aos ditames intrínsecos do
espírito e da imaginação? Se o ator acha que a sua base interna ou interior (o
espírito, a memória, a imaginação, o sentimento) e a sua estrutura externa (o
corpo, a voz) são muito semelhantes ao personagem, sua tarefa está enormemente
simplificada. Ele não quer criar tantas novas imagens quanto o ator cuja base
não é como o personagem. Mas onde o ator e o personagem estão opostos em
temperamento e semelhança, o ator fará bem em tornar a natureza o seu guia, e
procura na vida cotidiana em torno de si, ou em sua própria memória empírica,
aquelas pessoas e situações que mais intimamente sugerem o personagem. O ator
será cuidadoso em utilizar tais pessoas como matéria prima somente, e não como
modelos para imitação do personagem. Apenas não aqui como o personagem na peça
é concebido pelo próprio ator, será a criação final correta e verdadeira. Mas o
ator experimentará guardar suas impressões “num estado de fluidez”, de modo a
permitir a frase de Miss Cornell, e estar preparado para modificar, mudar,
cortar e acrescentar quando mais tarde ele conduz o personagem ao ensaio.
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